quarta-feira, dezembro 08, 2010

Lembranças tão imensas de nossa dor (parte final)

San Diego... A imagem não tem nada a ver com o post, só acho ela bonita. A história da foto fica pra outro post

Continuando então a saga do post anterior (cortei alguns episódios menores, então este é post final da série. Se bem que tem alguns episódios que vale post por si só). Buenas, como todos sabem, um dos momentos cruciais na vida é a escolha da faculdade. Pois bem...

- Escolhi minha faculdade com base na lógica inquestionável de uma colega, pela qual eu estava apaixonado, e que faria vestibular para essa mesma faculdade: "Ah, tu sabe desenhar bem, Heleno, então tem que fazer Arquitetura". Por que não, eu pensei? Afinal, eu ia poder ficar perto dela e arquitetura é a maior barbada, ficar fazendo uns desenhozinhos por aí...
  • Impacto: repeti 6 vezes (não, eu não errei a digitação) a cadeira mais importante da Faculdade de Arquitetura, a cadeira de Projeto 1. Finalmente, reconheci que meu pai estava certo ao me alertar que, talvez, e só talvez, Arquitetura não fosse para mim.
- Ok, então Arquitetura não dá. Resolvi pedir transferência de curso. Deixa eu ver agora, qual que escolho.. hmmm.. ok, quando eu era pequeno eu queria ser médico. Então vamos de Medicina! Mas pensando bem, Direito também é tão bacana, de repente ser um juiz e tal. E Ciências da Computação então? Computador é o futuro, meu pai já dizia. Ah... mas e Publicidade e Propaganda? Criar aqueles comerciais vencedores de Cannes que passam no Multishow. Se bem que Administração também pode ser uma hein, cursinho mais genérico, um 2º grau estendido. Hmmm... difícil escolher...
  • Impacto: como não conseguia decidir, solicitei transferência para essas 5 faculdades. Afinal, são tão similares...
- Bom, dificilmente vou ser aceito nas 5, transferência não é tão mole, são poucas vagas internas e depende basicamente do desempenho no vestibular. Mas o lado bom é que o processo de seleção vai decidir por mim, vou fazer onde me aceitarem. O problema é: eu era um nerd que sempre ia muito bem na escola (não tanto na faculdade de Arquitetura), e no vestibular passei em segundo lugar.
  • Impacto: recebi uma ligação da reitoria informando que fui aceito em 4 cursos dos 5 para os quais pedi transferência. Só Publicidade não me aceitou. Me vinguei fazendo Administração e hoje trabalho na área de publicidade.
- Após me formar em Administração, entrei no mestrado em Marketing. Durante a fase crítica de fazer a pesquisa para a dissertação e escrever papers, eu passava as tardes em casa realizando tarefas absolutamente inadiáveis (ex.: arrumar livros em ordem de assunto e dentro de assunto em lidos/não lidos e dentro destes em ordem alfabética por título, arrumar roupas por estilo, cor e frequência de uso, ler 4 jornais diários para me manter informado)
  • Impacto: dependi da caridade de professores para ser aprovado com base em papers geniais, escritos na madrugada da data de entrega. A dissertação só não ganhou nota máxima possivelmente porque gastei mais tempo escrevendo e reescrevendo os agradecimentos do que a própria dissertação em si. (quem tiver coragem pode ver a dissertação aqui)
- Esqueci a letra de uma música no meio de uma apresentação de improviso em um bar, com meu amigo Guga Fabbro na guitarra (e ele é totalmente fera, até professor é). Era uma música brasileira famosa, acho que do Cazuza. Da qual todos sabem a letra. Até eu. Até aquele dia.

  • Impacto: não cantei mais de improviso. Pelo menos não em português. E nunca mais me apresentei em público com o Guga.
- Aprendi a tocar violão e gravei uma música para uma menina que conheci no Mestrado, dedicando a música à ela e gravando no meu iPod. [Dedicatória com voz de locutor de rádio bagaceira] "Rosssssana, essa é pra ti... bãt óu de promissessss uí meiq, from de crêideuuu tchu de greiv, uên óuu ai uãn is iuuuuuuuuuuu...". Uma choradeira só. Não funcionou, mas tudo bem. A única questão é que uns 2 anos depois conheci outra menina, e para tentar impressionar a infeliz vítima, fui mostrar uma música bacana do U2 que gravei há um tempo atrás... (essa aqui, só excluí a constrangedora dedicatória)  
  • Impacto: mais uma noite solitária. Uma delas ainda é minha amiga.
- Fui enganado no orkut por uma menina. Ela me adicionou e veio falar comigo. Não a conhecia, mas a julgar pela foto do perfil devia ter antepassados dinamarqueses. Ela era do interior de SP e eu morava em Porto Alegre. O papo evoluiu e depois de alguns telefonemas, conversas cada vez mais sérias e longas - chegando ao ponto de combinar um encontro - a pessoa avisa que... hummm.. bem... então... aquela ali na verdade não sou eu... quer dizer, sou eu mas a foto não é de mim, entende?... silêncio... incredulidade... mas então qual é tua foto??? peraí, vou te mandar... tensão... internet lenta... foto pesada.... chega a foto... ... silêncio... incredulidade... incredulidade... incredulidade...... digamos que até poderia ser dinamarquesa, mas certamente não tinha acesso ao lendário sistema de saúde que permite plásticas gratuitas.
  • Impacto: mudei para o facebook, que pelo menos é mais bonito que o orkut e adotei critérios mais avançados na aceitação de "amigos". E também não faço mais longas ligações interurbanas do celular para quem eu não conheço pessoalmente.
- Certa feita, em momento crítico, uma namorada comparou certas partes de minha anatomia a de um ex-namorado, de uma forma que não me pareceu exatamente um elogio.
  • Impacto: perdi a capacidade de manter a concentração, e depois perdi boa parte de meu salário em inúmeras horas de 40 minutos com psicoterapeutas das mais diversas linhagens e estirpes.
Eu poderia continuar. Todo dia continuo aprendendo coisas, e geralmente através da dor. Talvez a dor seja a melhor professora. Ainda assim, não seria de todo ruim se viesse com uma anestesia de vez em quando. O único ponto é que com a anestesia eu não aprendo nada, e teria que fechar o blog pois não teria mais histórias para contar.

Para mim, quando as coisas dão errado (e geralmente dão), isso pelo menos vira uma história. E, no fim das contas, ficam as lembranças boas. Como as que tive ontem pensando no que aconteceu nos 2 shows do Paul McCartney que vi há pouco. Em parte uma tragédia financeira de alto calibre. Mas no futuro apenas um momento inesquecível. Vale um post... outra hora.

quarta-feira, dezembro 01, 2010

Lembranças tão imensas de nossa dor (parte 1)

Sim, eu era loiro, fofo (meu apelido até os 2 anos) e bonito. Depois, foi só dor e ladeira abaixo. Ver abaixo.
Momentos de dor. Que geram um impacto, e fazem você se enxergar de forma diferente e aprender, evoluir, tentar de novo. Todos temos momentos desses para lembrar.

Resolvi então fazer um breve balanço de minha vida (ok, nem tão breve, levei mais de 5 horas no auge da madrugada para escrever e reescrever) e compartilhar alguns dos meus momentos de dor e também os impactos que estas experiências me causaram. Ficou tão grande que vou dividir em 3 partes, publicando toda quarta. Assim, começo em ordem mazomenos cronológica:

- Tive a cabeça e os ombros encharcados de vômito pelo Jairo na fila de entrada no primeiro dia de aula da primeira série do primeiro grau na Escola Santa Cruz, em Nova Milano (RS). Fui socorrido pela minha prima mais velha, Yara, que foi chamada às pressas para me dar um banho. O conteúdo não era identificável, afora salame colonial.
  • Impacto: não como salame e fico longe de pessoas que acabaram de comer salame. Também prefiro não ficar na frente de pessoas mais altas que eu numa fila.
- Tirei a sobrancelha direita no terceiro ano do primeiro grau para "ver como ficava".

  • Impacto: aprendi a usar lápis de maquiagem, salvo novamente pela Yara e passei um bom tempo sem lavar o  rosto na escola.

- Era obrigado a ir à missa todo domingo (pela manhã!!!!!!) durante 8 anos.
  • Impacto: perdi a fé em Deus. E também não vou precisar casar, pelo menos não na igreja.

- Banhei meus cabelos com água oxigenada e fui ao sol, por não acreditar que isso deixaria meus cabelos loiros. Balela, eu pensava.
  • Impacto: passei a depositar minha fé na ciência.

- No primeiro dia de aula, no primeiro dia de funcionamento do Leonardo da Vinci, colégio mais exclusivo de Caxias do Sul, a professora pediu que nos apresentássemos. Declarei que meu sonho era revolucionar o mundo, como Albert Einstein. Se você lembra do seu segundo grau, certamente sabe que adolescentes espinhentos de 14 anos são espécie universalmente conhecida pela crueldade. E digamos que eu exagerei um pouquinho em meu sonho.
  • Impacto: ganhei o apelido de Einstein e fui um dos alunos mais populares do colégio. Se você nunca foi um loser popular, dificilmente vai entender que ser popular nem sempre é bom.
- Entrei no ônibus errado e fui parar Flores da Cunha. Como eu disse, estudava em Caxias do Sul e o destino era Nova Milano, em Farroupilha, a uns 30 km de Flores da Cunha. 
  • Impacto: passei a sempre olhar com muito zelo a placa que informa o destino do ônibus e desenvolvi uma desconfiança imediata de que estou no ônibus errado assim que ele pega uma estrada diferente da que sempre toma.
- Entrei no ônibus certo, dormi profundamente e desci no lugar errado. E São Sebastião do Caí definitivamente não é nada perto de Nova Milano.
  • Impacto: insônia em ônibus desde então. Insônia felizmente não transferida a aviões com escala, e espero que continue assim.
- Passei uma tarde nublada jogando taco-bola na beira da praia em Imbé em um feriadão. Sem protetor.
  • Impacto: aprendi que em dia nublado o sol também queima e tive que andar de chinelo por 3 semanas devido a queimaduras de 2o grau nos pés. Num início de inverno. Inverno de Caxias. No segundo grau. Onde eu já era bem popular.
- Eu era nerd, CDF, magro, sardento e orelhudo.
  • Impacto: baixa auto-estima e vida social inexistente (varar noites jogando Super Nintendo não é válido como vida social). Hoje estou menos orelhudo, pois fiz plástica em 1998. Isso porque meus pais se compadeceram de mim quando descobriram que eu estava usando Super Bonder nas orelhas. Funciona bem, se você não se importa de andar com uma Super Bonder no bolso caso a orelha se descole. E ela sempre descolava, nos piores momentos.
- Tinha baixa auto-estima
  • Impacto: conhecia mulheres vendo revista. Minha melhor tentativa foi escrever uma carta de amor em alemão, para a menina não ter ideia do que estava escrito, de tanta vergonha que eu tinha. Óbvio que ela foi falar com meu vô Ervino. Meu vô traduziu, até porque foi ele também que converteu minha carta do português para o alemão. Minha amiga ouviu atentamente. Veio conversar comigo. Me confessou que gostava do meu melhor amigo. Nunca mais escrevi cartas em alemão. E para tentar entender as mulheres, eu lia a Nova, que minha tia Nena assinava. Não creio que eu tenha entendido algo sobre as mulheres.
- Não tinha ideia do que as mulheres queriam.
  • Impacto: nenhum. Continuo não sabendo. Freud não sabia. Ninguém sabe. Nem vai saber