terça-feira, dezembro 17, 2013

What happens in Vegas...


... stays in Vegas? Sim. E não.

No início, tudo é festa. Depois, melhora.
Existem momentos em nossas vidas que quando lembrados parecem irreais. Sonhos. São o que eu chamo de momentos mágicos. Vegas é a capital mundial da magia. Noites mágicas.

Lá estava eu, perambulando pela balada. Era a penúltima noite na cidade e estava acompanhado de meu primo, fiel escudeiro e wingman, Fabiano, o Xiru. Uma festa ao ar livre numa noite muito agradável, como são todas noites na Sin City, tendo sob nossas cabeças a Torre Eiffel e à nossa frente o Empire State.

E lá estava ela, uma beautiful american girl. Chamemo-la de Brunette (literalmente, cabelos castanhos), embora seu nome real seja Noel.

A festa já não estava tão cheia, passava das duas. Como disse, eu perambulava acompanhado de meu wingman. No centro da pista, essa blue eyed girl dançando com uma amiga. Para mim, era a mais bonita da festa. Naturalmente, atraía todo tipo de homens. Homens bêbados, já que todos estão todas as noites bêbados em Vegas, incluindo as mulheres.

Eu observava as tentativas de aproximação dos rapazes, só para me divertir. Quem já esteve em Vegas sabe que os códigos de conduta lá são mais heterodoxos - querendo dizer que um approach usual é chegar dançando uma espécie de macarena com lambada e, sem muito papo ou zero papo, ir pegando na cintura da menina como quem diz: vem cá minha nega. Ou seja, a finesse e a sutileza de uma micareta. O que explica boa parte da mítica do lugar.

Mas, sendo um grande não-fã de micaretas, meu comportamento se resume a observar com um olhar atento. O que, em Vegas, tem uma "taxa de conversão" mais patética ainda que as tentativas de approach de um teenager movido à margueritas gigantescas usando a técnica da lambada.

Para minha surpresa, uma hora vi a Brunette cochichando com a amiga e olhando para mim com um sorrisinho, um sinal claro de que estão rindo da minha cara por algum motivo que eu nunca sei qual é. Muitas vezes vou ao banheiro só para ver o que tem na minha cara, afinal, deve ter algo na minha cara para rirem tanto de mim. Mas, infelizmente, nunca tem nada, só minha cara mesmo.

Em seguida, de costas, a Brunette começa a se aproximar de mim dançando de costas, eu estava a mais de 5 metros dela. Logo sua cintura estava a mais ou menos a uns 10 centímetros de mim e meus olhos estavam mais abertos que o de uma lêmur de Madagascar. E agora? Ainda olhei pros lados pra ter certeza de que era comigo. Ela chegou ainda mais perto, eu já sentia o perfume em seus cabelos, eu não sabia o que fazer, isso nunca aconteceu antes. Vegas, magia, desespero, sei lá.

Ela se virou e não me deu nem chance de perguntar seu nome ou o que ela estava fazendo ali a 5 cm de meu rosto. Ela me botou num brete sem saída. Vocês vão achar que estou mentindo, exagerando, mas meu wingman foi testemunha. Aliás, mais que testemunha, o wingman foi paparazzi, o que só fiquei sabendo depois. Se eu acreditasse em deus, teria certeza de que foi ele o culpado, sim, só pode, ele olhou para baixo aquela noite.

No entanto, logo descobri que os costumes mudam bastante conforme as línguas. Ou sou eu que sempre estive errado e nunca me avisaram. Ela interrompeu tudo na hora e imediatamente chamou atenção para meu faux-pas.

:p*|
:/  ):

Paparazzis não respeitam a privacidade de ninguém, nem ao menos de estranhos discutindo. Vou processar meu primo.
- Não, não! Não é assim! (Foram suas primeiras palavras, nem sabia seu nome).
- ? (Foram minhas primeiras não-palavras, não estava entendendo nada).
- Me segue.

:p*|
:/ ):

- Não! Não! Presta atenção! Tá errado.
- Mas...
- Psht. Me segue.
- Ok.

|**|
:) (:

- Entendeu agora?
- Ahnnnnnnn.

Difícil explicar como é o american way of making out, é mais puritano. América, a lógica calvinista influencia até o comportamento. Enfim, cada língua com seus modos.

Eu deveria ter escrito essa história antes, aliás. A riqueza de detalhes escapa. O que ela faz em Boston ("sim, sempre quis muito conhecer Boston")? Acho que alguma coisa a ver com arte, pintura. Tem cachorro. Ou não tem? Lembro da tatuagem, quer dizer lembro que tem tatuagem.

- E essa tatuagem no pescoço, legal. O que significa? (Sei lá o que era? Unicórnio? Golfinho? Flor de lótus?)
- Yadda Yadda Yadda... (blá blá blá)
- Tem outra?
- Sim, aqui ó - disse ela, baixando o cós de sua calça.
- o.O  ahhhhhhhh tá, entendi, nossa, muito bonita hein. (Unicórnio? Golfinho? Flor de lótus?) Mais alguma?
- Sim... Aqui mais pra...
- Ah tá, não precisa mostrar.

Vai entender os EUA, puritanismo e liberalismo. Eu ainda queria entender uma coisa, só pra esclarecer.

- Why me? Por que eu?
- Bom, tu viu como são os caras aqui né, nojentos, bêbados, sem noção, vão te pegando. E tu ficou na tua, tava ali quietinho.
- Ahn... (Algum dia isso poderia funcionar. Só nunca imaginei que seria na capital do pecado).

A essa hora, meu wingman havia voltado ao hotel e a festa estava nas últimas, pouquíssima gente ao nosso redor, seguranças "sugerindo" que fossemos embora.

- Bom, então hora de ir, minha amiga já tá cansada. (Muy amiga)
- Já? Mas são só 4 horas, a festa recém começou. The night is a child! Onde tu tá?
- Ali no (MGM? Bellagio?).
- Mas tá cedo, não vai.
- É, mas amanhã tem mais.
- Ah então, a gente podia combinar de...
- Olha só, nós somos solteiros, estamos em Vegas, sei lá...
- É, pois é, mas enfim, sabe como é, bom, a gente podia se falar, manter contato. Me dá teu face.
- Ah, mas é Vegas, deixa estar. Não foi bom? Então, a gente se divertiu, foi legal. Let it be, não tem que estragar.
- Estragar?
- É, deixa a memória dessa noite.
- Mas me dá só o face, não vou encher o saco. (Mentira).
- O táxi chegou. Bom, seeya Brazilian Guy.
- Email! Email! Só um email, emailzinho, vai...
- Tá. Anota aí noel524?@yahoo.com

|**|

E foi-se. Voltei a pé pro Harras, entre incrédulo e já nostálgico. No caminho, parei e fiquei meia hora ouvindo um cara tocando violão na rua, super original, emocionante mesmo, música própria instrumental. Conversei com ele, já tinha gravado uma demo, falei pra ele que tinha que divulgar, que era fantástico, que era único. Fiquei comovido, tanto talento e pouca sorte, deixei 20 dólares pro cara. Ele quase chorou, deve ter sido a maior gorjeta da vida dele. Mas o que são 20 dólares quando o mundo parece funcionar? A noite era mágica. Eles mereciam. Eu tinha que retribuir o Universo.

Cheguei ao hotel, o wingman não estava. Mas fazia mais de hora que ele tinha voltado da festa. Será que tá na roleta? Mas ele não joga. Duas horas depois ele chega.

- Bah, que gata, hein! Até fiz umas fotos.
- (Hahahahaha.) Não acredito! Sensacionais, me senti um ator. Mas onde tu tava, xiru?
- Ah, fui dar uma volta. Queria te deixar à vontade, vai saber.
- (Hahahahahah) Claro, certo, bom agora pode cair da cama e acordar.

No dia seguinte não mandei email algum para a Brunette. Cada noite em Vegas é outra noite, talvez ela estivesse certa. Pegamos o party bus novamente, um ônibus adaptado pra festa que te leva pra 3 baladas, sem pegar fila, com direito à bebida na faixa entre os deslocamentos, ocasião perfeita para economizar e entrar no clima da cidade por apenas $ 75 (ver PS). Na segunda balada daquela noite, a 1Oak, eu estava no corredor da saída dos banheiros aguardando o wingman. Aos poucos, vem saindo alguém de lá na minha direção, eu não estava prestando atenção e era escuro.

- Ahhhh, você não lembraaaa! disse a Brunette, com sorriso maroto.

Wow. Momento paralisia, estado de choque e descrença. Você? Aqui? Muita coincidência.

- Yes, I rememberrrr, of course! Volta aqui! Hey! Volta aqui!

- Seeya, Brazilian Guy!

- Não, não, não! Espera!

Nem parou, só olhou para trás sorrindo e seguiu com a amiga. Esperei a volta do wingman. "Xiru, tu não vai acreditar em quem passou aqui!". Assumimos o modo CSI. Nunca um lugar foi tão vasculhado e escarafunchado. Decidi mandar um email.

"Where r u?", só subject mesmo.

Alas, too little, too late. Pena, muito pouco, muito tarde. Mas caraca! Não dava pra acreditar em tanta coincidência, com dezenas e dezenas de baladas ótimas, encontrá-la ali foi muito inesperado. Há também um detalhe meio vergonhoso que me paralisou naquela hora quando a vi. Uma besteira, quanto à minhas roupas. De fato, eram as mesmas da noite anterior - só a parte externa, óbvio. Antes que me acusem de coisas piores, informo que as roupas estavam limpas e devido ao dress-code estricto, é preciso estar com uma cara de executivo meio social para entrar nas melhores baladas. Minha outra camisa era mais informal e não quis arriscar ser barrado na minha, como já fui em 2009. "Por vergonha, perdi a minha vida", parafraseando Rimbaud. A noite acabou e nunca mais a vi, e ela nunca respondeu ao  meu email e não a encontrei Facebook, pelo menos pra mandar as várias fotos que o paparazzi Fabiano registrou tão bem.

Na verdade, percebi depois que nada faria ela mudar de ideia naquela noite. Ela queria se divertir, não falar com um brasileiro desacostumado à etiqueta americana do engaging. "Não foi bom? Então, a gente se divertiu, foi legal. Deixa assim, não tem que estragar. Let it be." Não tem que estragar? Ora, a vida é feita para ser vivida e, às vezes, estragada.

Felizmente, também é feita para ser lembrada. Os momentos bons, as histórias oníricas, as noites mágicas, elas nunca terminam. Uma única noite pode ser infinita na memória.

Bom, respondendo à pergunta inicial, algumas coisas, muitas coisas, ficam em Vegas.

Mas algumas coisas de Vegas ficam em nós. A cidade é mágica. E mágica é mágica. Não se explica, não se repete, não se esquece. Então, quando me pego nostálgico, e ainda sem acreditar direito no que aconteceu naquela quarta-feira, lembro do que ela sabiamente me disse, "deixa na memória, deixa estar". Let it be.

She whispered words of wisdom.

Let it be...

|**|



PS1: falando nisso, é obrigatório ver o espetáculo Love (Beatles), do Cirque Du Soleil. Os outros são excelentes, mas Love is all you need. E se tiver sorte, veja uma banda da terrinha e uma das melhores do mundo, The Killers. Vegas will give you a shot at the night.

PS2: pensei bastante antes de contar essa história, é uma certa exposição talvez além da conta. Mas hey, eu já fiz isso antes, e além do mais não revelo nada que possa identificar as pessoas envolvidas, já que não estão em meu Facebook. E no fim, desde que aconteceu eu soube que algum dia eu precisava contar, foi algo mais forte que eu. Não fiz com objetivo de "querer ser o fodão", até porque eu basicamente não fiz nada, só fiquei parado. Isso sim foi uma mágica que nunca tinha funcionado.

PS3: se quiser fazer o Party Bus, compre o pacote Nite Tours e pelo guia Noah, fale que os brazilian guys indicaram, talvevz te deem desconto.

sábado, julho 27, 2013

Teatro é foda...


Literalmente, um papelão!

De tempos em tempos surge uma obra fundamental, daquelas que deveriam ser vistas por todas pessoas. Esse tipo de obra nos dá uma visão do sublime, um lembrete do que o ser humano é capaz de fazer, seja essa obra uma peça, um filme, um texto, um quadro, ou até mesmo uma telenovela*.

Pois estreou ontem no Teatro Raul Cortez em São Paulo uma dessas obras que já nascem clássicas. "Três dias de chuva", de Richard Greenberg, tem um ótimo texto - sem isso, qualquer peça já nasce morta - indicado ao Pulitzer de 2007. No Brasil, é dirigida por Jô Soares. Se você ainda não está convencido, só digo uma coisa. Quer dizer, duas coisas. Não, melhor, três coisas:

1) Carolina.

2) Ferraz.

3) Figurino (só vendo a peça mesmo para ver as peças - ou a falta delas).

Pronto, convenci 50% dos meus amigos. Para as outras 50%, eu diria o seguinte.

A sinopse estilo guia de cinema da Zero Hora - ou seja, uma indicação tão crua que O Poderoso Chefão seria resumido como "Chefe da máfia de Nova Iorque resolve matar seus inimigos" - seria "Pai deixa herança que desencadeia conflito entre seu filhos e um amigo, com revelações surpreendentes sobre o passado".

Não dá muita vontade de ver né? Mas confie em mim, você vai sair do teatro pensando sobre sua vida, suas escolhas, suas relações com seus pais, seus amigos e também refletindo sobre o amor,  a fama, a importância do dinheiro (spoiler: não é tão importante) e sobre o que afinal importa na vida, entre outras coisas. E fazer tudo isso com seriedade, leveza e sendo muito engraçada ao mesmo tempo é mais raro do que encontrar carne de verdade numa esfiha do Habib's.

E quanto você vai gastar para ter toda essa experiência? R$ 60. Se você tem meia entrada, embora isso seja "raro", vai investir os melhores R$ 30 da sua vida - o que dificilmente pode ser dito dos R$ 30 que você pagou para ver Velozes e Furiosos 6 (?!?!) com um monte de teenagers aborrecentes falando ao seu redor** e aquele crunch crunch crunch da pipoca. (O cheiro da manteiga é um bônus extra adicional).

Aliás, acho que é só questão de tempo para essa peça virar um filme - em Nova Iorque, por exemplo, o elenco tinha Julia Roberts e Bradley Cooper -  e isso seria ótimo para levar a obra a muito mais gente. Agora, nada substitui a magia do teatro, pois como diz nosso filósofo dominical, quem sabe faz ao vivo, bixo! E como diz o próprio diretor, outro peso pesado da televisão mas recheado com conteúdo em vez de abobrinhas, "no teatro também se exerce uma profissão de risco, como os trapezistas. Teatro é trapézio sem rede."


Aplausos em pé para esses trapezistas.


  * Hahaha peguei vocês!

** Espantosamente, mas não de todo inesperado dada a minha sorte, uma guria começou a falar com o namorado atrás de nós, no que imediatamente virei a cabeça e lancei aquele olhar estilo laser para ela entender que não iria tolerar conversas. Funcionou. Por 10 minutos. Aí tive que a encarar novamente, fulminando-a por 5 segundos dessa vez, uma eternidade. Além disso fiz o clássico gesto de pshhh com o dedo, querendo dizer educadamente para ela que "PUTA QUE PARIU!!! VAI CALAR A PORRA DESSA BOCA OU NÃO PERCEBEU QUE ESTÁ NUM TEATRO???". Mesmo assim, ela não parou totalmente de falar, só diminuiu a voz. Que o Papa a excomungue e ela vá para o inferno

Naturalmente, tendo a sina que tenho, ela não era a única ao nosso redor sendo mal educada. Um senhor à nossa frente ria como uma hiena no cio a qualquer fala minimamente engraçada e ainda fazia adendos do tipo "essa foi boa! Huahsuaahsuahsuashusuhsh". Na saída da peça, vimos o Dráuzio Varela e quase pedi pra ele fazer um quadro no Fantástico sobre a epidemia da má educação no Brasil, doença que acomete todas as classes sociais. Acho que está na hora de implantar a PEC do Silêncio nos teatros e cinemas.