segunda-feira, novembro 01, 2010

Vou me mudar pra Dinamarca

Ok, não são da Dinamarca. Mas e daí?

Em momentos de tensão é possível descobrir coisas que em tempos bons não descobriríamos. Nesta eleição confesso que fiquei chocado com o baixo nível da campanha de Serra. Já adianto que respeito quem votou em Serra, a maioria é gente do bem. Não acho que sejam "uns dementes, sem educação, que não pensam, que querem o atraso", assim como muitos pensam dos que votaram em Dilma.

Eu inclusive votei na Marina Silva no primeiro turno, pois acho que precisávamos de uma renovação e a Dilma nunca me pareceu a candidata ideal. Agora, neste segundo turno não era possível ver Serra e o que há de mais retrógrado na política brasileira ganhar. Dilma e o PT, com todos defeitos que têm, ainda estão anos-luz a frente do PSDB.

Pois bem, estava no twitter quando vejo uma tuitada de Marcello Serpa, http://twitter.com/marcello_serpa. Se você não sabe, o cara é um dos maiores e mais premiados publicitários do Brasil, dono da AlmapBBDO, agência brasileira mais premiada em Cannes. Tive a oportunidade inclusive de participar de um curso, Grandes Publicitários, e ver uma entrevista que Celso Loducca, outro grande publicitário, fez com ele. Muito bom o curso, que teve também Nizan Guanaes, Washington Olivetto, Alexandre Gama e Roberto Justus - ou seja, a nata da publicidade brasileira, uma das melhores do mundo.

O Marcello Serpa escreveu o seguinte:

"Votei contra intolerância, autoritarismo, ideologia Jeca, peleguismo, aparelhamento.... Preferia ter votado a favor de alguma coisa :)
PSDB R.I.P. 47% querem votar num partido, num princípio, numa proposta e não só contra o PT.
Voltei, votei e agora me preparo para mais 4 anos na contramão."

Eu, http://twitter.com/rockstar1000, resolvi ironizar:

Pô que legal, votou na Dilma! RT @Marcello_Serpa: Votei contra intolerância, autoritarismo, ideologia Jeca, peleguismo, aparelhamento....

E ele me deu uma réplica:

@rockstar1000 Comemore, mas não me encha o saco.

Nunca imaginei que ele fosse me responder, não costumo falar com pessoas famosas no twitter, então me surpreendi ao ver seu comentário. Como me pareceu rude, fiz a tréplica:

Idem para você meu caro RT @Marcello_Serpa: @rockstar1000 Comemore, mas não me encha o saco.

Não acho que ele tenha sido preconceituoso, coisa que vi em muitos comentários que li, afinal não falou contra pobres, nordestinos, etc. Até concordo com ele que boa parte da população quer votar a favor de algo e não contra. Realmente, Rest In Peace PSDB. A mediocridade da oposição é visível a qualquer um que tenha os olhos abertos. Ou até mesmo, fechados.

Mas quando li que o Marcelo votou contra a intolerância, imediatamente pensei que uma das maiores intolerâncias dessa campanha foi o infame debate sobre aborto, levantado pelo campo de Serra.
Autoritarismo? Serra tinha um vice do DEM, antiga Ditadura.
Ideologia Jeca? Qual é a ideologia da coligação Serra-DEM? Ódio?
Peleguismo e aparelhamento? Quer dizer que os outros governos, nacionais, estaduais, municipais não tem isso também? Aliás, um dos males da política brasileira como um todo.

Enfim, se Marcello Serpa, com todo seu currículo e educação pensa assim, não espanta haver tanto preconceito, ódio, intolerância, autoritarismo e ideologia jeca no Brasil.

Sei que não sou perfeito, nem sou dono da verdade, mas tento manter um nível. Tento. Tenho também meus preconceitos e todos os têm, embora a gente às vezes nem saiba quais são. Ter preconceitos faz parte da biologia do ser humano.

E estou citando o Marcelo Serpa como exemplo apenas, pois também me espanto com a opinião de muitos amigos meus, e somos a elite de fato do Brasil. O problema não é votar em Serra, repito. O problema é votar por preconceito. Somos todos a favor de paz, amor, democracia, desde que seja para nós. Desde que não mexam com meus privilégios. E desde que os pobres (vagabundos, todos claro) fiquem no seu cantinho sem nos atrapalhar querendo votar em que mais os favoreceu.

E apesar de tudo isso, fico feliz de ver que muitas pessoas pelas quais tenho imenso afeto conseguem discutir em nível elevado. Mesmo que eu discorde delas, é um prazer discutir com quem tem conteúdo e não preconceito, ou ler um artigo menos inflamado por paixões. Mas com tanta gente agora querendo ir embora do país, a jugar pelas mensagens na internet, quem teve vontade de ir embora fui eu, triste com tão baixo nível.

Quem sabe para a Dinamarca, onde eu teria que lavar meus próprios pratos, entre outras outras coisitas más (talvez uma visão idealizada mas não deve estar longe da verdade):
  • Onde provavelmente eu teria que estacionar meu carro, e não largá-lo na mão de um vallet que nunca vai poder comprar o carro mesmo que economize toda vida.
  • Onde não vou nunca ver mulheres com caras resignadas segurando bandeiras ao sol anunciando prédios.
  • Onde não vou ter que recusar dar esmola para alguém no trânsito, pois não vai haver ninguém pedindo esmola no trânsito.
  • Onde meu prédio não vai ter porteiro e o entregador de pizza vai poder vir até minha porta, e não vou precisar descer e receber a pizza através de uma grade.
  • Onde não vou ver seguranças de terno embaixo de guarda-sóis de uma tal Haganá.
  • Onde vou poder deixar meu carro em casa e andar com transporte público, ou de bicicleta (ok, bicicleta já é utopia para mim =).
  • Onde não pensem que os que recebem ajuda do Estado sejam vagabundos.
  • Onde impostos sejam realmente revertidos em serviços de valor para a população.
  • Onde educação seja realmente valorizada pois é o único caminho para o crescimento sustentado.
  • Onde aborto, sexualidade e religião não sejam tema de campanha.
  • Onde não ter religião seja comum e não visto como um defeito ou aberração.
  • Onde um partido autoritário e retrógrado não se intitule Democrata (nos EUA os democratas são os liberais)
  • Onde o voto não seja obrigatório.
  • Onde as mulheres sejam loiras, de olho azul, altas e liberais/libertinas.

Ok, desconsiderem essa última. No Brasil as mulheres são muito mais bonitas. Mas confesso, tenho preconceito contra feiúra. A feiúra que vem de dentro. Daquela que foi o que mais vi nessa disputa. Que essa feiúra fique para trás.