sábado, agosto 07, 2010

Mas não foi isso que eu quis dizer...



Já é difícil o bastante decifrar uma mensagem quando estamos de cara a cara com alguém. Quando estamos distantes então, as dificuldades se multiplicam. A questão é aquela que todo mundo sabe: a comunicação é falha (mas é nossa vida, como diz o slogan de uma grande empresa :)

Fiquei pensando nisso porque já vi tantas vezes comunicações falhas arruinarem relacionamentos. Ou se não arruinaram, pioraram bastante. Se você vivesse na Grécia antiga e quisesse falar com sua Helena ou Heleno, teria que falar cara a cara. Ou escrever uma carta rudimentar em papiro ou argila, o que não foi um grande estímulo à indústria dos correios na época. Se você vivesse na Inglaterra Vitoriana, da mesma forma, teria que escrever uma carta - só que dessa vez já seria mais fácil escrever, enviar e receber resposta. 

E hoje? Hoje você pode falar cara a cara, webcam a webcam, iphone4 para iphone4, msn a msn, gmail a gmail, facebook a facebook, twitter a twitter, sms a sms, e até mesmo por carta. Mas quem escreve cartas hoje em dia? Fico pensando naqueles romances antigos, em que os amantes trocavam longas cartas, longas mesmo, do tipo que hoje faria sua mão doer de tanto escrever. 

Certamente havia conflitos, problemas de entendimento, mas suponho que tudo tivesse que ser mais explicado, mais bem construído, mais estruturado, pois não havia chance de você dar uma réplica instantânea, ou pegar o telefone e ligar na hora para esclarecer algum ponto duvidoso. Se hoje ficar alguma dúvida, você responde na hora. Ou liga na hora. Se isso permite resolver imbróglios de forma mais rápida, também permite criar confusão de forma quase instantânea, a partir de uma vírgula no lugar errado ou da falta de um :) ao final de uma observação irônica. Aliás, a ironia frequentemente pode virar contra o "ironeiro".

E como nos comunicamos hoje então? Pior do que antigamente? Diria que não. A comunicação e as tecnologias de comunicação mudam o tempo todo. As consequências de cada mudança são difíceis de prever. Hoje podemos acabar um relacionamento por sms, em vez de usar uma carta. Mais brutal? Talvez. Errado? Quem sou eu para julgar. Indelicado? Definitivamente. 

A tecnologia e a facilidade de comunicação não botaram por terra a necessidade de sermos dignos, educados, civilizados. O que elas fazem é facilitar a indelicadeza que existe em cada um de nós, aproveitando-se de nossa capacidade inata para emocionarmo-nos de formas imprevisíveis. O que eu quero dizer com isso? Pense naquela ligação que você fez às 4 da manhã para sua ex saindo bêbado de uma balada. Certamente Sócrates não passou por essa.

quarta-feira, agosto 04, 2010

Somos culpados, mas de quê?


Pesquisa mostra que a culpa mais dolorosa é o lamento por não termos agido como queríamos 
por Contardo Calligaris

A MELHOR polícia do mundo não conseguiria manter a ordem se respeitássemos as leis só por medo da punição. A sociedade funciona (mais ou menos) porque infrações e crimes despertam não só a PM e a PF mas também nossa consciência: a perspectiva do arrependimento nos inibe.
O problema, como Freud constatou, é que a gente se culpa mais do que é necessário: enxergamos crimes onde não há, consideramos que nossas vagas intenções e nossos sonhos noturnos já são delitos e nos castigamos para aliviar os tormentos de nossa culpa. Seja como for, até os anos 60, o sentimento de culpa -necessário ou patológico e excessivo- parecia ser só isto: o arrependimento por ter desrespeitado uma norma ou uma autoridade.
Em seu seminário (um pouco críptico) de 1959-60 ("A Ética da Psicanálise", Zahar), o psicanalista francês Jacques Lacan propôs algo diferente: a culpa mais relevante e mais sofrida surgiria não por termos desobedecido a uma norma, mas por termos neglicenciado nosso próprio desejo, por termos desistido de agir como queríamos. Podemos nos arrepender de nossas transgressões, mas lamentamos, mais amargamente, as ocasiões perdidas.
Era uma pequena revolução no mundo da clínica. De fato, o sentimento de culpa é onipresente (ou quase), e as transgressões, em geral, são poucas. É lógico, portanto, que a culpa que nos atormenta seja sobretudo um efeito de nossa covardia (que é crônica), e não de nosso atrevimento (que é raro).
Pois bem, no ano passado, Ran Kivetz e Anat Keinan publicaram uma pesquisa que confirma experimentalmente a intuição de Lacan (que, claro, eles não leram): "Repenting Hyperopia: an Analysis of Self-Control Regrets" (Hipermetropia Pesarosa: uma Análise dos Arrependimentos do Autocontrole, "Journal of Consumer Research", vol. 33, setembro 2006).
Em três protocolos de pesquisa, Kivetz e Keinan confirmaram o seguinte: 1) todos condenamos as decisões que só enxergam o prazer imediato sem levar em conta as conseqüências futuras (desde comer a segunda fatia de bolo ou gastar dinheiro que não temos até cometer um pecado pelo qual responderemos na porta do purgatório); 2) mas essa condenação é fugitiva, efêmera: a longo prazo (depois de um ano, por exemplo), considerando a decisão que nos pareceu sábia (não comer a segunda fatia de bolo, não gastar, não pecar), o que prevalece é o arrependimento por ter perdido uma ocasião, por não ter agido segundo nosso impulso ou desejo.
Na metáfora ótica usada por Kivetz e Keinan, sabemos que nossos impulsos são míopes (só enxergam a satisfação do momento) e achamos certo agir como hipermetropes (o que, em geral, significa deixar de agir, focalizando e receando as conseqüências afastadas de nossos atos); a curto prazo, nós nos felicitamos por ter pensado no futuro, enquanto, a longo prazo, lamentamos ter sido hipermetropes e desperdiçado satisfações que estavam ao nosso alcance imediato.
Kivetz e Keinan sugerem uma explicação: a longo prazo, os atos passados são integrados numa espécie de balanço de nossa vida, em que devemos decidir se a corrida foi boa, se valeu a pena. Nesse balanço, o lamento pelas coisas que queríamos e não ousamos fazer pesaria mais que o mérito das "sábias" decisões que comandaram nossas desistências.
De qualquer forma, o fato é que o arrependimento por não ter escutado o desejo parece falar mais alto e por mais tempo do que o arrependimento por ter ousado transgredir. Seria aventuroso concluir que, para não se arrepender no futuro, a gente deveria atuar qualquer desejo.
Mas resta uma suspeita, ou melhor, uma lição: freqüentemente, as razões que mantêm nosso comportamento nos padrões esperados (obediência à ordem social, a nossos pais, à tradição etc.) são apenas racionalizações de uma covardia da qual nos arrependeremos um dia.
Para entender plenamente o alcance da pesquisa, esqueça a segunda fatia de bolo, os gastos e os pecadilhos (exemplos triviais usados na experiência) e pense em decisões cruciais de sua vida: uma mudança de carreira à qual você renunciou porque teria desapontado ou preocupado seus próximos, uma paixão amorosa que você calou porque teria encontrado a desaprovação dos mesmos. Pois bem, a longo prazo, essas desistências doem mais do que doeria a culpa por ter transgredido normas e expectativas, seguindo nosso desejo.


O Calligaris é muito bom, recomendo a leitura de sua coluna na Folha às quintas. Outro texto que toca em assunto similar é este, que fala sobre as dificuldades (e infelicidades) de ser pai.

domingo, julho 25, 2010

Olhe para trás com raiva



Há, sim, perdas irreparáveis
Há, sim, feridas que não fecham
Há, sim, tristezas infindáveis
Há, sim, pessoas que não prestam

Nem tudo tem lado positivo
Nem toda injustiça é justiçada
Nem tudo tem algo criativo
Nem toda escuridão será iluminada

Ver algo bom em tudo
É acreditar que a vida sempre ensina, mas...

Há dor que não ensina
Há dor que só dói
Há chama que só queima
Há amor que destrói

Olhe para trás com raiva.




Inspirado pela ótima peça "Olhe para trás com raiva", de John Osborne, em cartaz no Teatro Vivo, em São Paulo (trechos aqui). Resolvi ver devido ao título, que é o contrário da clássica Don't Look Back in Anger, do Oasis (melhor banda do mundo :)

segunda-feira, julho 19, 2010

Meu Casamento Fracassado e Como Voltei ao Meu Antigo Amor

Para A.M., por me ouvir, me instigar, me incentivar


Fui seduzido. Mas não foi da primeira vez. Ela já havia tentado antes. Conheci ela lá por 2002 (vamos chamá-la de G.). Mas foi só em 2005 que conversamos a sério pela primeira vez. Ela que me chamou para conversar. Eu estava bem, um relacionamento bacana (com R.), que tinha começado em 2000, terminou em 2003, com alguns flashbacks, e voltou a ficar sério em agosto de 2005, assim que acabei meu mestrado. Logo que eu voltei para R - foi aí que G me chamou. Quis ouvir o que ela tinha a dizer. Curiosidade mesmo. Então lá fui eu, marcamos no horário de almoço. Não tive a melhor das impressões logo que a vi mais de perto, mas ouvi com atenção. G não era de todo desinteressante, mas eu recém tinha voltado a me relacionar e não havia grandes motivos para eu querer saltar fora, tudo estava bem. Assim, terminamos a conversa, agradeci mas não a procurei mais.

Não demorou muito, no entanto, para meu relacionamento com R entrar em crise. Feia, ela quis acabar comigo alegando dificuldades mas eu gostava muito dela, e me esforcei para mostrar que eu tinha valor, que merecia uma segunda chance. Assim ficamos, mas já não era exatamente o mesmo sentimento, o gosto da crise permaneceu no fundo da boca. Um ano depois, as coisas estavam melhores, mas foi aí que uma amiga me apresentou T. A verdade é que eu não tinha digerido bem a crise do final de 2005, e queria ter novas experiências. Gostei de T, na verdade, eu já a conhecia mas nunca tinha pensado que teria algo a ver com ela. Finalmente decidi deixar R, comuniquei minha decisão, já de forma irreversível. Ela tentou me segurar, disse que ia me tratar melhor. Mas porque não pensou nisso antes? Tinha que esperar me perder para perceber meu valor?

E lá fui. Começando novamente. No início tudo era bacana com T, novo, mas o tempo trouxe o tédio. E quando eu me entedio, perco o tesão, muito rápido - foram menos de 6 meses. Me tornei burocrático. A rotina - esse cavalo de tróia dos relacionamentos - me pegou. Cumpria com as obrigações, mas muitas vezes me pegava pensando se não estaria melhor com R, só que agora não havia mais como voltar, R já estava com outro.

E foi bem aí que G me chamou novamente para conversar. Só que dessa vez, eu já não estava contente com a outra. E G foi bem mais sedutora. Pegou num ponto fraco meu, me disse exatamente o que eu queria ouvir, vi nela a possibilidade de ter algo que eu sempre quis, um desejo antigo, que eu perseguia sem nem mesmo saber se era isso mesmo que eu queria. Ora, a maior parte do que desejamos pode se revelar somente isso - um desejo, que quando atingido já não nos deixa feliz. Mas como saber se não temos o que desejamos?

A ciência da psicologia oferece alguns caminhos, e a maior parte deles envolve se informar com outras pessoas que passaram pela experiência para saber como se sentiram. Uma forma de medir a diferença entre expectativa e realidade. Sempre acreditei em pesquisa, então fui atrás de pessoas que conheciam G melhor, até mesmo algumas que já tinham se relacionado com ela. Falei com várias pessoas, eu não estava totalmente seguro. No fim, o desejo antigo falou mais alto. E comecei um novo relacionamento.

Intuição. Ouçam suas intuições. Nem sempre acreditem nelas, mas considerem como um input interessante. E olhando para trás, toda minha ânsia em pesquisar, em querer ter certeza, era no fundo um temor de que o que G me oferecia talvez não fosse bem o que eu procurasse. Mas não me culpo, ver a história acontecida e saber o que tínhamos que ter feito é o que fazemos de melhor. Mas só conseguimos fazer isso olhando o que já aconteceu e não temos nenhuma garantia de que não vamos repetir o mesmo erro. Aliás, não posso chamar de erro o que aconteceu. Se eu voltasse no tempo, sabendo o que eu sabia na época, creio que teria 99% de chance de ser seduzido por G. Realmente meu desejo era forte.

Sem entrar em muitos detalhes, o casamento com G fracassou. Não era o que eu achava que seria, nem de longe, nem de perto. Desde o início foi tudo muito difícil, e com o temperamento forte vinham também vários momentos de tédio. Comecei a ficar angustiado, percebia que as coisas não estavam nada bem. Mas continuei. E G também percebeu que eu não era o que ela precisava. Até que menos de 4 meses depois, em 12 de junho de 2007, meu aniversário, G. me chamou para conversar logo pela manhã. E disse que não estava dando certo.

Eu só pude concordar, mas não tinha certeza se ela queria acabar ali ou se eu teria uma nova chance. Ao fim da conversa, entendi que estava acabado. O mais engraçado de tudo é que eu não senti tristeza. Senti alívio. Eu não fiz o que ela teve coragem de fazer. Foi a primeira vez que um relacionamento meu terminou por iniciativa da outra parte. Mas não foi traumático, foi libertador. Foi um fracasso? Com certeza. Foi tudo ruim? Não, sempre aprendo algo, e conheci várias pessoas através de G. Acabamos bem.

Tive um tempo para ir a Nova Iorque, um antigo sonho meu, e foi maravilhoso. Voltei renovado, feliz, disposto a começar tudo de novo. E menos de 3 meses depois encontrei outra. Na verdade, reencontrei. R me chamou novamente. Ela, meu primeiro amor verdadeiro, que me fez tão feliz por cerca de 5 anos entre idas e vindas. E agora ela estava diferente, eu também estava, e decidimos recomeçar. A princípio, sem um grande compromisso. Combinamos que tentaríamos, e que se tudo corresse bem poderíamos oficializar. Seis meses depois, casamos. Estamos juntos até hoje. Quanto tempo vai durar? Como saber? Mas percebi que meu desejo antigo não estava equivocado. Eu só não estava pronto. E agora estou.

Vou tentar de verdade, quero que dê certo de verdade. Já me entediei algumas vezes com R? Certamente. Já tive uma crise seríssima novamente? Sim, e muito pior do que a primeira lá em 2005. Estive a um passo de cair fora. Mas tive paciência, esperei as coisas melhorarem, me esforcei para isso. E hoje, vejo um futuro melhor. Meu tesão voltou, não que eu estivesse infeliz, mas estava acomodado, meio no automático. R me chamou para conversar, numa boa, pois via que as coisas não estavam bem, e deixou bem claro que era preciso mudar.

Demorei a realmente entender. Mas semana passada, tivemos uma nova conversa. E vi que se eu quero que as coisas mudem, devo mudar eu primeiro. E que a melhor maneira de mudar, não é mudando tudo de uma vez. Não só é difícil, como pode causar muita frustração. Resolvi mudar de atitude, fazer um gesto, mesmo que pequeno. E mudar um gesto pode mudar uma cabeça - ou duas. Vou me esforçar. Não vai ser sempre fácil, claro, não vai ser tudo felicidade. Dificuldades sempre existem.  

Mas o desejo pode fazer a diferença - não o desejo declarado, o desejo racional - e sim o desejo profundo, o desejo de felicidade, o desejo que brota de uma mudança de olhar. É só sair da rotina, tentar algo nunca tentado. Se não der certo, tentar outra coisa. Conversar, numa boa, de mente aberta e coração também. Até que a gente construa algo maior do que qualquer um dos dois poderia sozinho. Para mim e para R.

Nota do autor: o casamento e o amor de que falo não necessariamente se referem a pessoas reais.

terça-feira, maio 18, 2010

Mulher que é mulher


Mulher que é mulher não gosta de conversar. Conversar implica uma troca entre duas pessoas. Mulher que é mulher gosta de falar. Falar muito. Mas só ela. Fala pelo outro, fala pelos outros. Se o homem que é homem ouvir, melhor - mas ele não ouve, porque homem que é homem continua prestando atenção no futebol.

Mulher que é mulher (a partir de agora, MQEM) não discute a relação. Discute tudo. A relação, a falta de relação, o excesso de relação, o início da relação, o meio da relação, o fim da relação. Discute até quando não tem mais relação. MQEM adora falar de outra MQEM. Falar mal. Das roupas, do sapato, da maquiagem, dos cabelos, dos maridos, dos amantes, da magreza, da gordura, da vulgaridade, da santidade.

MQEM não fala ou tem dúvidas sobre o que vestir. Isso se tiver menos de 3 anos. Assim que passa a falar e poder escolher, MQEM faz análises, comparações, contrapontos, perguntas, questionamentos e teorias a cada peça de roupa a usar. Naturalmente, o homem que é homem concorda com qualquer escolha, desde que não mostre o decote.

MQEM não fala sobre filmes. Chora. Vendo romance, drama, comédia, terror, guerra, ação, desenho, documentário. Chora vendo trailer de filme. Até vendo a propaganda antes do trailer do filme.

MQEM não fala ou se preocupa com a forma. Se horroriza, atormenta, perde o sono, desespera. Então, MQEM não faz dieta. Vive em dieta. Dieta do abacaxi, da sopa, da proteína, do Dr. Atkins, da Jane Fonda, do sol, da lua, das estrelas.

MQEM não pára de falar. Ou melhor, pára, mas não por falta de vontade ou assunto. Pára por exaustão. No fundo, talvez, a MQEM não goste de falar, mas como o homem que é homem não fala, ela não tem opção. Por isso, vou parar de falar, porque a sala está cheia de mulheres que são mulheres. E já estão começando a me olhar feio.

Crônica desenvolvida na Oficina de Crônicas, do Carpinejar, em São Paulo, 14/5/2010, a partir da crônica "Homem que é homem", de Luis Fernando Verissimo

quinta-feira, fevereiro 12, 2009

Sobre tatuagens e evolução

"Far away there in the sunshine are my highest aspirations. I may not reach them, but I can look up and see their beauty, believe in them, and try to follow where they lead"
Louisa May Alcott - 1832-1888

Cerca de 4 anos atrás, eu pensei seriamente em fazer uma tatuagem. Nunca eu havia me interessado ou cogitado uma, mas circunstâncias da época me fizeram interessar pelo tema. Eu precisava então decidir qual seria a tatuagem a ser feita. A âncora, o coração, as estrelas, o índio, o dragão, a tribal, nada disso me fascinava. As inscrições em chinês/japonês/coreano/oriental então, mais do que isso: as abomino. Nunca poderia casar com uma mulher que tivesse uma tatuagem em chinês/japonês/coreano/oriental (paz, felicidade, amor, sabedoria e alegria, são basicamente essas as palavras que as pessoas usam). O que eu não entendo é porque tem que ser em japonês??? Claro, parece mais sábio, afinal eles são sábios, e se escrever em português, bom aí é vulgar e coisa de gente burra. Vai entender... Latim é aceitável, desde que não seja Carpe Diem, e grego é exótico, e portanto bonito. Mas enfim...

A minha tatuagem deveria ser algo que tivesse um significado profundo para mim. Não são muitas coisas que se encaixam: meu nome (nunca a de uma namorada! Apagar depois é muito caro), minha família, alguma frase "sábia", alguma letra de música ou poesia, o nome de uma banda (Oasis)... Ou... algo relacionado a ciência, que sempre me fascinou e sempre me fascinará. O símbolo atômico? A estrutura do DNA? O homem vitruviano? Mas o que mais me fascinava era a biologia. Eu estava no mestrado e minha dissertação era baseada na psicologia evolucionária, estando totalmente imerso no mundo da Teoria da Evolução.

Então, a consequência lógica disso era que minha tatuagem seria.. bem, ninguém menos do que Charles Darwin. Sim, o meu braço teria por todo o sempre a foto clássica do velho barbudo, a espantar colegas de trabalho, pessoas na praia e namoradas. Mas eu não me importava, isso tem um significado para mim. Se alguém pode tatuar um índio anônimo, eu poderia tatuar o meu herói científico.


Porque então meu braço hoje continua tão branco quanto sempre foi? Não sei, em algum momento desisti. Talvez a perspectiva de eu espantar qualquer mulher que fosse, nunca mais casar ou ter filhos e viver em celibato fosse um pouco demais para mim. Talvez eu nunca tenha cogitado seriamente, só tenha pensado como um exercício teórico do tipo "E se eu tivesse uma tatuagem, qual seria?". Parte da explicação certamente tem a ver com um episódio bem pessoal envolvendo minha namorada na época, que decidiu fazer uma tatuagem - o que inicialmente me chocou, pois eu achava que a conhecia. Sempre achamos que conhecemos as pessoas das quais somos íntimos. Não. Não conhecemos a nós mesmos, quanto mais outra pessoa. Eu, para provar algo que não sei o que é, pensei que deveria fazer uma também.

Me arrependo de não ter feito? Não, porque ainda posso fazer ela a qualquer momento. Quero? Não, na verdade passou. Eu estaria arrependido se a tivesse feito? Provavelmente não pois a indelebilidade da tatuagem acionaria meu mecanismo de redução de dissonância cognitiva e eu acharia todos motivos para me convencer de que ter feito a tatuagem não só foi bom e certo, como foi o fator responsável por uma transformação pessoal que mudou minha vida e me catapultou ao sucesso. Ok, sou um pouco dramático mesmo.

Mas toda essa história é pra lembrar que esse ano se comemora o aniversário de 200 anos do nascimento de Charles Robert Darwin e 150 anos do lançamento do mais importante livro científico já escrito. Um homem, solitário, sentado sobre o ombro de gigantes, mudando a história do mundo. Esse é o poder da ciência, o poder da humanidade, o poder da beleza, o poder da curiosidade, o poder do amor. Nem tudo está perdido. Espero termos muitos outros Darwins, embora eu já tenha desistido de ser o próximo, como um dia eu sonhei. Mas posso, sim, apreciar a beleza que há em tudo isso. Darwin conclui sua obra com um dos parágrafos mais famosos da história da ciência:

"Há uma grandeza nessa visão da vida, com seus diversos poderes tendo sido originalmente insuflados pelo criador em poucas formas ou numa; e que, enquanto esse planeta tem seguido circulando de acordo com as leis fixas da gravidade, de um início tão simples uma infinidade das mais belas e maravilhosas formas tenha evoluído e esteja evoluindo." (Darwin, 1875, p.429)

Bravo, Darwin!

terça-feira, maio 06, 2008

Como desmascarar um vidente


Fui num vidente. Sim, vocês leram direito: visitei um vidente. Os seis ou sete leitores que acompanham meus escritos sabem que sou cético, ateu e não acredito no sobrenatural. Por que então fiz isso? E o que essa experiência me revelou? Segue um relato detalhado do que aconteceu. Tomem suas próprias conclusões.

No início de 2007, movido por uma curiosidade insuportável, acordei às 6 da manhã do sábado para ir até uma cidade do interior, a cerca de 150 Km de Porto Alegre, visitar um vidente. Vamos chamá-lo aqui de Seu Roque (que vem a ser seu nome real :). Cheguei até ele através de uma amiga que relatava adivinhações verdadeiramente fantásticas, do tipo que poderiam abalar minhas crenças mais profundas se fossem confirmadas. Claro, que eu nunca cheguei a me convencer dos poderes mediúnicos do Seu Roque - ainda mais de alguém que tem o nome do ajudante do Sílvio Santos - mas a situação chegou a um ponto em que eu tinha que ver com meus próprios olhos. Em teoria, o vidente conseguia adivinhar coisas profundas sem ao menos saber o nome do cliente.

Pois bem. Quando liguei para marcar a "consulta", Seu Roque perguntou meu nome, quem havia me indicado e de onde eu era. Não inventei nada, respondi à todas perguntas, mas já fiquei desconfiado pois se ele fosse "o cara" não precisava perguntar nada, certo?

Chegamos lá, eu e minha namorada na época, para termos uma perspectiva dupla. Seu Roque me recebeu com um aperto de mão mole, do tipo que irrita e pode revelar preferências ocultas. Ele estava com vários colares e vestia uma camisa de seda, brilhante e vermelha. Chegamos à sua casa, onde são realizadas as consultas. Ele me conduziu à sala, onde havia uma mesa no centro, em cima de um barril, do tipo onde se joga cartas. A mesa era meio torta, sentado nela meu braço ficava inclinado para a esquerda.

E começa o espetáculo! Seu Roque pega um baralho de cartas, bem gastas, e começa a embaralhar. Enquanto isso vai me fazendo perguntas (mais perguntas!). Quando afinal ele começaria a fazer as previsões tão esperadas? Sempre num tom de voz calmo e de baixo volume, "delicado" se vocês me entendem, ele ia perguntando. Meu nome completo, onde morava, o que fazia....

O negócio já começava a me preocupar. Então botou 3 cartas na mesa e disse que cada uma delas significava algo que não lembro. Perguntou porque eu estava ali. "Bem, pra me consultar. Nada específico" [aha! Peguei ele, que certamente esperava ouvir uma ladainha sobre minha saúde / situação financeira / situação amorosa / família / trabalho, tópicos que cobrem 99% das pessoas que consultam videntes.

E então começou o jogo de verdade. Embaralhou de novo as cartas, parecia nervoso, um pouco tenso, e deixava cartas caírem no chão. Espalhou todas e me fez mais umas 15 perguntas: onde trabalhava, em quantos lugares já tinha trabalhado, quanto tempo fiquei em cada emprego, minha profissão. Eu desde o início decidi que ia falar sempre a verdade, pra ter certeza de que as previsões não estivessem contaminadas. Com base nestes dados, apontou 3 cartas de forma aparentemente aleatória e começou sua cantilena. Vejam as previsões por assunto:

Trabalho: disse que alguém na "firma" fez um trabalho forte contra mim, e que esta pessoa iria me atrapalhar. Não identifiquei ninguém com esse perfil, mas sempre tem alguém que não simpatiza com você, então a previsão vale pra praticamente qualquer pessoa. Para me livrar disso eu preciso de uma lavagem espiritual.

Relacionamentos: preciso cuidar do meu relacionamento para ele não ter o fim que outros tiveram (acabaram), o que é algo lógico.

Planos pro futuro: após perguntar quais eram (esperava que ele me dissesse), afirmou que todos se realizariam. Ainda bem, já que isso é o que eu queria ouvir, e o que todo mundo quer ouvir. Se eles não se realizarem é porque faltou um trabalho espiritual. De qualquer forma, não vou poder processar o Seu Roque se eles não se concretizarem.

Família: quis saber quem era minha família, outra coisa que eu esperava que ELE me informasse. "Nome completo do pai?", "Quantos anos?", "O que ele faz?".. Ao saber que meu pai é político, vaticinou sua mais surpreendente previsão: "Seu pai tem que se cuidar com um grupo de políticos que está contra ele". Como ele sabe disso? Afinal, não existem disputas na política e todos concordam com todo mundo. Isso me chocou muito, tanto que já avisei meu pai pra se cuidar.

"Sua mãe vai ter um problema de saúde, mas vai ser passageiro". Hmmm.. outra coisa surpreendente, pois dificilmente as pessoas ficam doentes no decorrer de um ano. Gripes, resfriados e afins são extremamente raros hoje em dia. Já avisei minha mãe também.

"E sua irmã, ela é casada?"

"Não"

"Então ela já foi casada?"

"Hmmmm, não..... mas namora há 10 anos"

"E o namorado dela, já foi casado né?"

"Hmmmm, não.."

"Mas já teve algum relacionamento sério antes dela"

"Hmmmmm, não que eu lembre"

"Rãrãm... eles vão ser muito felizes.", foi o que Ser Roque viu após o diálogo revelador. Já avisei minha irmã.

Após falar um pouco mais sobre minha família, perguntou se eu queria saber mais alguma coisa. Eu dei a consulta por encerrada. Minhas convicções continuaram evidentemente as mesmas de antes da consulta. Videntes são charlatões.

Se você conhece algum vidente daqueles que "sabe tudo", me avise que vou visitá-lo. Certamente será divertido. Com a experiência acumulada, pretendo abrir meu próprio serviço de clarividência e iluminar todas almas sedentas por saberem o futuro.

Já dizia alguém: fazer previsões é complicado, especialmente sobre o futuro.

sábado, janeiro 26, 2008

Heath Ledger e os Leões


Quando comecei a ver o 7º documentário seguido, no mesmo dia, sobre leões, me dei conta de duas coisas:

1) Eu não gosto tanto assim de leões
2) Eu preciso fazer outra coisa

Resolvi escrever. Acho que isso vai impedir a morte iminente de metade da minha massa cerebral após tantas horas vendo o Discovery Channel. Evitei o BBB porque nem meu plano de saúde cobre morte cerebral completa.

Mas antes uma informação importante: para que nasça um único leãozinho, é necessário que ocorram cerca de 3.000 cópulas entre um casal de leões. Sim, o leão, além de rei da floresta é um verdadeiro rei da cama.

Se por um lado isso dá vontade de querer ser um leão, por outro lado... ai, de novo! Por que a gente não dorme um pouco?

Não, chega de leão! Nem tigre, puma, leopardo, pantera, chita, jaguatirica ou gato do mato. Afinal, qual é a fixação dessa gente com o leão? Começo a desconfiar de um fundo sexual nessa obsessão. É o leão isso, o leão aquilo, o leão persegue a gazela (na verdade é a leoa, pois o leão fica aguardando o prato ser morto), o leão mata a gazela, o leão come a gazela, o leão dorme, o leão acorda, o leão copula, o leão copula, o leão copula, o leão copula, o leão copula... o que? Eu, obcecado?

***

Mas quando veio o comercial do Ab Shaper, saí da minha hipnose, dei uma zapeada, e no Telecine vi um comercial que me fez lembrar de algo que me entristeceu nestes últimos dias. Heath Ledger. A morte abrupta de Heath Ledger.

É natural que fiquemos chocados com uma morte tão repentina, inesperada, de alguém tão jovem e bem sucedido. Mas seria ele feliz? Ao que parece, o ator enfrentava uma crise de depressão após sua separação, e foi encontrado na cama ao lado de vários comprimidos, indicando um possível suicídio. Fosse a causa que fosse, fiquei com a impressão de que me senti mais triste do que deveria, ou esperaria ficar.

Não tenho como fugir, no entanto, do que talvez seja a causa mais profunda dessa tristeza. Heath Ledger simplesmente me parece uma cópia de meu primo Fabio, que também morreu trágica e abruptamente. A semelhança é impactante para mim. Ambos jovens, ambos bonitos, ambos carismáticos. Pode ser que eu só esteja arranjando explicações para o que não sei, mas o fato é claro: um me lembra o outro. E com isso vêm todas memórias de momentos compartilhados, de afetos multiplicados, de risadas nascidas da mais profunda conexão. A morte nos lembra da fragilidade de qualquer vida, da preciosidade dos poucos momentos em que estamos aqui, lembra, enfim, de nossa própria mortalidade, incompreensível mas absoluta. Não é a toa que ficamos tanto tempo fuçando a vida íntima dos leões.

Nossa vida é uma sucessão de perdas. Pessoas de quem gostamos nos deixam. Outras crianças roubam nossos brinquedos. E seguimos vivendo, com buracos n'alma e sem alguns chocalhos. Ao fim, nem Christian Dior consegue remendar nossos trapos. Mas também, todos esses buracos não necessariamente tornam a peça inutilizável. De alguma forma misteriosa, sua falta pode nos levar a compensar sua ausência com mudanças mais profundas. E nunca tornamos a ser os mesmos.

O que tudo isso quer dizer? Fora o fato óbvio de que filosofia não é meu forte, pode significar muitas coisas. Gosto de pensar que, como Henfil disse, se não houver frutos, valeu a intenção da semente. Que sou grato por ter vivido com tantas pessoas fantásticas, mesmo que tenha já perdido muitas e vá perder ainda mais. Que isso leve a uma tentativa de aceitação da mortalidade, nossa e dos outros - digo tentativa, porque acho que de certa forma nunca nos conformamos, e isso é bom. Para alguns, o conforto é a vida eterna. Para mim, o conforto é ter tido o privilégio de simplesmente ter vivido. Isso, sim, é um milagre.


"Prefiro antes os desacertos do intento às certezas da inércia".
Pe. Antonio Vieira.

Veja o vídeo de Brokeback Mountain, com a belíssima música de Gustavo Salaolalla, The Wings.

segunda-feira, outubro 29, 2007

O que aprendi sobre escolher uma carreira

Não é boa a sensação de ter perdido tempo. Dizer que o tempo não se perde, ou que simplesmente passa, que sempre se aprende algo, "a experiência me ensinou muito", às vezes só irrita em vez de consolar. Às vezes não se aprende nada, às vezes não existe lado positivo e simplesmente se perde tempo. Meus alunos de marketing devem conhecer bem essa sensação.

E escolher uma carreira pode ser muito frustrante. Algumas pessoas levam muito tempo para descobrir algo que as satisfaça. Outras nunca descobrem, e na verdade é possível se sentir muito feliz mas sempre há momentos que enchem o saco, momentos de dúvida, de crises existenciais.

Eu pelo menos me questiono a toda hora se não deveria ter seguido a carreira musical com minha banda, a Falcatrua, e ter me suicidado aos 27 anos - a idade limite para virar uma lenda do rock (Morrison, Hendrix, Cobain, Joplin, et ali). O detalhe de que eu estaria morto há 4 anos me fez rever essa opção.

E quando chegou a hora de escolher de verdade, antes do vestibular, descobri que não tinha a mínima idéia do que eu queria "ser". Já tinha passado pela fase desenhista, médico (ginecologista, óbvio), cientista... A carreira que eu queria mesmo era não fazer nada e ser vagabundo. Não sabia na época que esse também era o objetivo do LFV, e foi muito bom saber que não estou sozinho no mundo.

Virar vagabundo, no entanto, é um pouco complicado, como descobri ao fazer o mestrado em marketing, há 3 anos. Dias inteiros vendo tevê. Acordando às duas da tarde. Navegando na internet. Tomando sol no Parcão. Jogando tênis na Hidráulica. Arrumando os armários. Colocando os livros em ordem alfabética, separados por assunto. Tudo, absolutamente tudo eram atividades urgentes e importantíssimas, a dissertação naturalmente tinha que ficar em segundo plano até eu decidir se separava as camisas por cor ou por estilo. Quando cansei de tanta atividade estafante, me dediquei à dissertação por 2 semanas, uns 6 meses depois que o prazo tinha acabado. Passei com B. Fico com medo de que o MEC descubra isso algum dia, casse meu título e exija de volta o dinheiro da bolsa. Por favor, não avisem.

***

Outro período importante foram os 4 anos enrolando na faculdade de arquitetura - minha primeira escolha no vestibular - o que de certa forma foi um tempo perdido. Eu seguia uma estratégia cuidadosamente calculada para não deixar de ser sustentado por meus pais e poder me dedicar à tarefa importantíssima de virar Monkey Island 2 por meus próprios méritos, sem olhar o roteiro passo-a-passo. Minha salvação foi que a UFRGS implantou a política do jubilamento, e se o aluno rodasse muito ou demorasse para se formar, digamos uns 15 anos, seria expulso. Eu tinha colegas que estavam "estudando" há uns 12 anos e eu parecia me direcionar para este caminho.

Visualizando então minha cerimônia de jubilamento, resolvi rodar mais algumas vezes e ver o que acontecia. Afinal, vejam só, jubilamento, que nome bonito e imponente. Pronuncie cada sílaba para ver, JU-BI-LA-MEN-TO. É um evento cósmico, um feito majestático, um dia pra se vestir como rei, nada daquela coisa bagaceira de formatura e toga. "E agora quero chamar meu colega Heleno". E lá ia eu, vestido com uma capa bordada a ouro, botar minha coroa - jubilamento exige coroa, no mínimo. "Pelos poderes a mim investidos, como reitor magno desta universidade, eu o declaro JUBILADO".. tambores.. fogos de artifício.. fotos.. reconhecimento da sociedade.. choro...

OK, minha imaginação é bem colorida.

O que aprendi então sobre escolher uma profissão?

- Prolongue até o limite a escolha, de preferência não escolha nada e seja sustentado por alguém.

- Se for obrigado a escolher, não vá pra arquitetura ou ramos afins que exigem muito trabalho e estudo. Escolha administração, como eu fiz depois de abandonar a arquitetura. É um curso mais fácil do que pintar com têmpera no jardim de infância, com a diferença de que essas pinturas têm um sentido mais concreto do que daunsaizin, gerar valor, alavancar os assets, e fazer um planejamento estratégico para estartar um tãrn-araund baseado no bélence-escór-cardi embasado nos córi-vélius, e outros termos tão comuns em bízines.

- E, o mais importante, treine para ficar lendo colunas sobre celebridades ou esportes durante todo dia na firma e ainda assim aparentar que está trabalhando em algo muito profundo. Se for mestre mesmo, aprenda a deixar recados e bisbilhotar o orkut através de uma planilha excel. Afinal, o que é urgente não pode esperar.

Só não esqueça de deixar um recado pra mim.

quinta-feira, outubro 04, 2007

"Olha que estranho o sonho que eu tive hoje..."

Há uma frase que seguidamente invade minha mente:

"O sono é uma necessidade evolucionária profunda"

Li isso em um artigo sobre o sono e desde então ela não sai da minha cabeça. Geralmente, quando vou dormir ou quando estou acordando me lembro dela.

Por que comento isso? Porque não se sabe a razão exata de o sono ser tão presente em tantas espécies animais. Alguns especulam sobre a importância de dormir para "gravar" memórias, outros sobre a reconfiguração cerebral que permite termos mais insights e sermos melhores em resolver problemas lógicos após o sono. Muitas outras hipóteses existem, e provavelmente a causa não é uma só, como em quase todos fenômenos complexos.

Escrevo também sobre isso porque junto com o sono vêm os sonhos. E como são estranhos! Pessoas que conhecemos misturadas à pessoas que não existem, pessoas de um contexto juntas à outras que não têm nada a ver com aquele ambiente, lugares que nunca vimos e lugares familiares, comportamentos absurdos, situações atemorizantes.

Hoje sonhei que tinha voltado à Nova Iorque, onde estive recentemente, sendo que no norte de Manhattan as estradas eram de chão. E lá, em frente ao mar (!), encontrei um amigo que tocava numa banda comigo morando com a mulher num super loft, sendo que ele praticamente não têm dinheiro e não entende mais de 1% das letras que canta em inglês.

Tudo bem, mas conheço poucas coisas mais chatas do que ouvir alguém contando um sonho. As pessoas têm uma necessidade absoluta de contar tudo que lembram nos mínimos detalhes. "Aí então a ameba saltou do carro e foi tomar um sorvete. Aí eu me dei conta que a ameba era eu. Aí uma Ferrari passou a mil atropelando o Bono. E aí...."). Vou poupar meus 3 leitores disso. E não me contem sonhos em detalhes, por favor. Vale para esposas, ex-mulheres, parentes, amigos, papagaios (sim, animais sonham também).

Ainda assim, para quem sonha é difícil não ficar pensando sobre o sentido dessas histórias criadas à nossa revelia. Se não pensamos no significado, pelo menos pensamos no sonho em si e tentamos lembrar das situações. Numa noite podemos ter vários sonhos, mas só lembramos deles se acordamos num estágio do sono chamado REM, sigla para Rapid Eye Movement. É fácil reconhecer quando estamos sonhando, basta ver os olhos de alguém mexendo de um lado para outro ao dormir.

Ok, mas qual o sentido de um sonho? Muito já foi escrito sobre isso, Freud provavelmente foi quem tentou responder a esse enigma com o maior nível de detalhismo. No entanto, parece que ele estava errado em quase tudo, e nisso também. Alguns cientistas hoje afirmam que não há sentido nenhum nos sonhos, seriam apenas divagações aleatórias de nossa mente libertada do controle deliberado que exercemos quando em vigília. É difícil acreditar nessa teoria, tantas são as ocasiões em que sonhamos com algo que tem nos preocupado ou impactado de alguma forma.

O sentido, se há, certamente tem a ver com situações específicas ocorridas a cada indivíduo, e com a personalidade, comportamento, vivência e atitudes dessa pessoa. Nada de avançado nisso, é óbvio até e não poderia ser diferente. O que não parece tão óbvio é que mesmo que saibamos todas circunstâncias, experiências e pensamentos de alguém, não temos como fazer uma leitura adequada de um sonho e desvendar seu significado, como a psicanálise defende.

Se já é complicado explicar comportamentos conscientes, quanto mais algo sobre o que temos menos controle ainda. Abraçando a recente teoria, cada vez mais fundamentada, de que não temos realmente livre arbítrio, e que simplesmente criamos explicações para nossos comportamentos, podemos ter um caminho para desvendar o sentido dos sonhos. Mesmo assim, não acho que faremos isso de uma forma confiável.

No fundo, podemos especular, criar muitas teorias, mas entender realmente o significado de um sonho parece estar no reino dos caminhos sem rumo, uma empreitada sem sentido. O que podemos, sim, é buscar desvendar o porque de sonharmos e o porque de termos essa "necessidade evolucionária profunda" de dormir. Há muito ainda a descobrir. Enquanto isso, vou continuar dormindo e sonhando.

Falando nisso, está me dando uma bobeira agora.... Depois conto meu sonho em detalhes pra vocês.

quinta-feira, dezembro 28, 2006

A fina sintonia

Raramente nos damos conta do quão frágeis nós somos. Nosso corpo é uma máquina intrincada, com milhões de partes e engrenagens. E poucas vezes, ou poucos de nós, passamos por doenças realmente sérias. A questão não é porque temos tantas doenças, e sim, por que não temos MAIS doenças?

Que nossos corpos passem a maior parte do tempo funcionando bem, isso sim é algo próximo a um milagre. É simplesmente muita coisa que pode dar errado e no entanto não é o que acontece - nossa biologia certamente não segue a Lei de Murphy. Claro, praticamente todos têm algum problema ou outro, mas em 95% do tempo estamos bem. Agora, é só aparecer uma dor de estômago (ou "estongo" como dizem alguns) para a gente esquecer de todo o resto e se concentrar na dor. E só então nos damos conta do pouco que é necessário para nos tirar do combate.

Que uma pequena pílula possa combater essa dor, ou que possa alterar completamente nossa percepção ou até mesmo nos matar, isso me parece ainda mais fascinante. Compare nosso tamanho com a de uma cápsula e reflita um pouco sobre isso. Mas nada é mais impressionante do que perceber que coisas muito, mas muito menores, podem nos fazer muito mal: são milhões e milhões de espécies de vírus e bactérias e seres afins, prontos para nos detonar ao mínimo sinal.

E a medicina, apesar de todos avanços, ainda sabe muito pouco. Não conseguimos explicar até agora como a maior parte das drogas psicotrópicas funcionam (prozac, valium , anti-depressivos e etc.). Estamos ainda engatinhando.

Tudo isso para dizer que há algumas semanas passei muito mal, com dores horríveis e diarréia. Tenho certeza que vocês não querem detalhes do tipo quantas vezes fui ao banheiro ou como certamente bati o recorde mundial de volume de flatulência por minuto. Basta dizer que tive que pedir a minha irmã que me levasse ao hospital de madrugada. Sim, certamente lá eles saberiam aliviar minha dor. Que nada! Não fizeram nenhum exame, somente a tradicional consulta (anamnese é o nome que os "doutores" usam) e um pouco de apalpação (existe?) na barriga.

Me botaram numa sala com umas 5 senhoras tomando soro, me deram Buscopan na veia e soro fisiológico pois eu já estava desidratado. Uma hora depois a dor retornou com força total e a doutora simplesmente olha minha ficha, preparada por outra médica, e me avisa que minha "disenteria" não é de origem infecciosa ou algo assim. Bom, mas então vem daonde? E qual a solução? "Espera que passa". Extremamente reconfortante e sofisticado! Com todo avanços, não conseguem tratar uma dor de barriga. Voltei pra casa com dor e passei mais uns 4 ou 5 dias "ca**ndo água" como definiu com muita elegância um amigo meu.

Moral da história: da próxima vez vou rezar para pegar uma pneumonia ou sífilis, que pelo menos têm um tratamento mais sofisticado do que "espera que passa".

O poder da Música


“A vida sem música é simplesmente um erro, cansaço, exílio.”
Friedrich Nietzsche


(Escrito em 24/02/2006, em Buenos Aires)

Estou caminhando sozinho pela Calle Florida, no centro de Buenos Aires. São 23 e 30 e a rua está quase deserta. Estou ouvindo música no meu iPod, uma música dos Stereophonics, que é belíssima, “Handbags and Gladrags”. É um cover na verdade, mas isso não importa.

E no entanto, apesar de estar frio e ser tarde, umas 12 pessoas estão paradas ouvindo um homem solitário cantando “I Started a Joke” com sua guitarra e seu mini amplificador. Eu quase parei, mas já estava ouvindo uma música muito boa. Agora mesmo parei de escrever por uma meia hora porque comecei a ver uns clipes do Franz Ferdinando e do U2 na MTV local, bandas que vou assistir na próxima quinta (2/mar). E ver esses shows foi justamente o motivo de minha viagem.

Antes disso, estava no show dos Stones, com mais 70 mil pessoas no estádio do River. Quase morri esmagado e sem ar mas valeu cada um dos R$ 60.000 centavos. Ao fim do show, já exausto e quase desmaiando com o budum a minha volta, olhei para as pessoas atrás de mim – e eram muitas pois eu estava simplesmente espremido na grade. Estavam todas felizes, cantando junto ou apenas olhando o show com uma pura expressão de felicidade no rosto.

E no meio deste show já estava pensando em como a música tem esse poder fantástico de reunir dezenas de milhares de pessoas para ouvir 4 marmanjos (velhacos?) tocando. Mas que velhacos! Como pode? Como pode ser tão impactante? Tudo bem que eles são apenas uma das maiores bandas do mundo, mas mesmo assim impressiona. E aposto como 99% das pessoas não tinham idéia alguma sobre o que Ráguer (é como os “hermanos” pronunciam Jagger, pois eles falam todas línguas com a pronúncia deles, óbvio) cantava.

A música, até certo ponto, independe da língua ou do significado das letras, como qualquer um que faça um “enrolation” de vez em quando pode saber. A melodia, o ritmo, a levada da música já indicam muito sobre o que a música quer dizer, elas refletem um estado de espírito. Por exemplo, usando os Stones: Satisfaction é uma música de levada rápida, com poucos acordes e poucas mudanças de melodia, é uma música agitada, pra cima. Já Angie tem uma levada de balada, com acordes mais sombrios - ela começa com um Lá menor, sendo que os acordes menores geralmente induzem a um sentimento mais melancólico do que os acordes maiores.

Outro aspecto que atrai multidões para esses shows é o fator “celebridade”, a chance de ver ao vivo pessoas que geralmente só são vistas em clipes e sites. A cultura da celebridade é algo típico de nossa era. Talvez só no âmbito da religião existam fenômenos similares. Não é por nada que shows já foram comparados à celebrações religiosas.

O melhor show que vi na vida foi do Coldplay, em São Paulo, em 2003. Fui pra lá numa excursão de ônibus organizada pela Ipanema, bate e volta. Fora o fato de que eu quase não conseguia andar de tão chapado com a fumaça que infestou o ônibus durante toda viagem, foi tudo maravilhoso. E foi como estar numa missa, foi catártico, intenso. Todas pessoas cantavam juntas todas as músicas, o que até surpreendeu o Chris Martin. E para mim aquilo foi o mais próximo de uma cerimônia religiosa que eu já vi, com a diferença de que não fui obrigado a comer uma bolacha que é literalmente o corpo de uma pessoa, por mais absurdo que isso seja.

No final, a música talvez seja tão universal e poderosa porque faz parte de um instinto, um instinto mais básico do que a linguagem, algo que surgiu antes de qualquer língua. Qualquer bebê entende a linguagem universal da música. Todas culturas humanas conhecidas conhecem, criam e apreciam músicas. Os estilos mudam, os formatos evoluem, mas a música em suas mais diversas manifestações permanece e nos emociona.

Eu mesmo já tive bandas. Também não saio de casa sem meu Ipod e estou sempre cantarolando algum som. Não consigo viver sem música. Por isso, só posso reforçar e atualizar o que Nietzsche já disse há muito tempo: a vida sem música seria um saco.

quarta-feira, dezembro 20, 2006

Simplesmente Amor



Normalmente não choro vendo filmes. Quem já me acompanhou no cinema sabe disso. Agora, me acontece muito de entrar um cisco no olho bem nas cenas mais sentimentais. É um problema que tenho.

Essa é a cena inicial do filme Simplesmente Amor (Love Actually, no original, que significa "Na Verdade, Amor"). A tradução está no post logo abaixo.

Para mim, esse filme é apenas regular, digamos um 7,5. Mas essa cena específica permaneceu na minha memória como a mais impactante de todo filme.

Assista, e você entenderá porque. Na Verdade, Amor, cada vez que a revejo entra um cisco no meu olho, dos bem grandes, que é bem difícil de tirar.

Por que? Porque é verdadeira, é praticamente um documentário, mostrando pessoas reais recebendo pessoas amadas num aeroporto. Cenas que acontecem todo dia, mas muito mais no Natal e no Fim de Ano. E que são a mais perfeita tradução do que é Amor, com A maiúsculo.

A cena significa muito para mim também por um motivo bem pessoal. Me lembra de meu primo Fábio, que viveu vários meses em Londres e depois fez uma volta ao mundo, entre outubro de 2001 e dezembro de 2002.

O Fábio era praticamente um irmão para mim, fomos sempre muitos ligados. Infelizmente, e essa é uma palavra muito fraca pra descrever o que aconteceu, o Fábio faleceu em junho de 2004. Como acontece com todas pessoas que amamos quando nos deixam, isso teve um impacto devastador sobre mim e mudou a forma como vejo o mundo.

Amo o amor, e amo as pessoas que amo. Sempre vou lembrar dele, não importa o que acontecer. E ao ver essa cena é como se eu estivesse o recebendo mais uma vez, depois de um longo tempo.

Claro que isso nunca mais vai acontecer. Mas certas pessoas especiais perduram em nossa memória, não importando o pouco ou muito tempo que passamos com elas.

Todos dias que passam penso nele, e sempre sua falta é mais forte nos momentos em que reunimos toda família, como vai acontecer logo mais.

Só posso lembrar dele, e agradecer por ter feito parte de minha vida.

Obrigado Fábio, meu irmão.

Feliz Natal e Feliz Ano Novo adiantado a todos.

Tradução da cena inicial de Simplesmente Amor

"Sempre que eu fico deprimido com o estado do mundo, eu penso nos portões de desembarque do Aeroporto de Heathrow (Londres). A opinião geral está começando a sugerir que nós vivemos em um mundo de ódio e ganância, mas eu não vejo assim. Parece para mim que o amor está em todos lugares.

Frequentemente ele não é particularmente enaltecido ou motivo de notícia, mas está sempre lá - pais e filhos, maridos e mulheres, namorados e namoradas, velhos amigos. Quando os aviões atingiram as Torres Gêmeas, até onde eu sei, nenhum dos telefonemas das pessoas a bordo foram mensagens de ódio ou vingança - foram todas mensagens de amor. Se você olhar bem, eu tenho uma sensação de que você vai se dar conta de que o amor, na verdade, está em todo lugar."

Voz de Hugh Grant

domingo, dezembro 17, 2006

Porque precisamos de relacionamentos (e ovos)


Eu amo Woody Allen. Quer dizer não ele exatamente, mas os filmes dele. Tem um filme que revi outro dia, "Noivo Neurótico, Noiva Nervosa" (1977), uma tradução simplesmente ridícula para o nome original "Annie Hall" - que é nome da principal personagem, interpretada por Diane Keaton. Como todos outros filmes dele, fora os da fase em que fez filmes dramáticos a maneira de seu ídolo Ingmar Bergman, este é muito engraçado.

A história gira em torno do relacionamento entre Woody Allen e Diante Keaton, que aliás foi mulher de Allen. No final, eles acabam se separando.

Cerca de um ano após terem se separado, eles se reencontram para uma conversa "na boa". Após rever sua ex-namorada e conversar com ela sobre tudo que aconteceu, Woody Allen fala que foi muito bom ter revisto Annie e que vendo ela, lembrou de uma piada:

"Tem esse cara e ele vai pro psiquiatra e diz:

- Doutor, o meu irmão está louco, ele acha que é uma galinha.

Então o doutor diz:

- Bom, então porque você não interna ele?

- Eu até internaria, mas eu preciso dos ovos.

Bom, eu acho que é bem isso que eu sinto sobre relacionamentos. Você sabe, eles são totalmente irracionais, e loucos, e absurdos... mas, ahn, eu acho que a gente continua insistindo neles porque, ahn, a maioria de nós precisa dos ovos."

Achei simplesmente genial. A piada é muito engraçada, e o que ele diz faz sentido. Muitas vezes os relacionamentos parecem sem sentido e absurdos. Mas não temos como viver sem eles, a vida seria muito cinza sem os altos e baixos de qualquer relacionamento. E quanto mais profunda a relação, mais temos razões para vê-los como irracionais.

Acontece que no fundo, os relacionamentos têm uma lógica própria e não são nem mais nem menos irracionais que qualquer comportamento humano. A verdade é que homens e mulheres brigam, pensam e agem de forma diferente, mas não conseguimos viver um sem o outro. A razão principal para isso naturalmente é o instinto de perpetuar a espécie - outra forma de dizer que somos obcecados por sexo, e que não conseguimos passar um dia sem pensar nisso, quer dizer, desde que eu fiz sete anos nunca consegui passar um dia sem viajar nessa história. Mas isso é outra história.

E afinal, preciso dos ovos.

quarta-feira, dezembro 13, 2006

Calcinhas e revoluções sociais



As últimas aparições de celebridades sem calcinha me preocuparam muito. Vejam vocês mesmo as fotos no post anterior e reflitam. Não me preocupa pelo fato disso ser mais um sintoma da degradação moral do mundo, de que "os jovens estão perdidos", ou de que "no meu tempo não existia isso". Tudo isso já sabemos e não tem mais volta. Aliás, felizmente eu diria, ou senão como eu conseguiria fumar "unzinho" (Marlboro, suas mentes poluídas!) sem ser incomodado aqui no banheiro de onde eu trabalho?

O que me preocupa mesmo é se essa moda chega às mulheres "comuns", como aquela sua vizinha gostosa ou, pior, aquela velha gorda do 701. Sim, imaginem as conseqüências desastrosas para nossa vida em sociedade:

- A produtividade da economia, já em baixa, cairia a níveis dramáticos. Isso naturalmente porque os homens não conseguiriam mais se concentrar no trabalho tendo aquela colega boazuda sentada na sua frente com uma saia mais fina e transparente do que um papel de pão. Pensem só em quantas vezes as canetas cairiam no chão, ou quantas vezes a tomada apresentaria problemas forçando a pessoa a se esgueirar por baixo da mesa. E as mulheres então! Não ficariam quietas até descobrir quantas celulites tem a boazuda aquela, para depois ficar horas no corredor comentando com as amigas: "Vocês nem sabem: ela também tem celulite!! E além disso, não se depila!! Que horror."

- A indústria de calçados seria obrigada a mudar completamente o estilo das tênis e sapatos masculinos, inclusive abolindo por completo os chinelos. Por quê? Todos calçados teriam superfícies espelhadas especialmente projetadas para não distorcer imagens. Os mais pobres teriam que se contentar com uma gambiarra, amarrando pequenos espelhos a seus calçados. E no verão, como chinelos não comportam superfícies espelhadas, teríamos que usar sapatos fechados causando surtos epidêmicos de fungos e um cheiro insuportável de chulé no ar, forçando todos a usar aquelas máscaras de doente. Pelo lado das mulheres, veríamos o surgimento de aparatos sofisticados para contrabalançar esse novos sapatos, como espelhos contra-reflexivos e proteções óticas polarizadas que só deixam passar a luz em uma direção.

E estas são apenas algumas das conseqüências imediatas. Nem quero pensar em outros efeitos e nas turbulências políticas e sociais, incluindo possíveis constrangimentos no mandato da governadora Yeda aqui no RS.

Enfim, como sempre, há uma lógica por trás desse novo comportamento feminino. Sim, meu caro, sempre há uma lógica no comportamento feminino, embora poucas vezes os homens entendam, e muitas vezes as mulheres não saibam explicar - porque muitas vezes simplesmente não há explicação.

Não, elas não querem chamar a atenção e deixar homens babando por todos os lados. Estão simplesmente cuidando da sua saúde, pois usar calcinha faz mal. Vejam o post abaixo para mais informações. O resumo é que médicos afirmam que usar calcinha é prejudicial à saúde, e que certas áreas precisam estar sempre arejadas. E quem sou eu para discordar da ciência?

Assim, novamente conclamo as mulheres a aderirem o mais depressa possível a essa moda, evitando assim muitas doenças. E enquanto o futuro não chega, eu, por via das dúvidas, já adaptei meus sapatos.

segunda-feira, dezembro 11, 2006

Atenção Mulheres: Usar calcinha faz mal!!


Esta semana fiquei sabendo de uma notícia que precisa ser divulgada imediatamente a todas mulheres: usar calcinha faz mal. Quem diz não sou eu e sim médicos renomados. Para ver a reportagem completa, clique aqui.

Assim, está explicado o comportamento estranho de muitas celebridades que expuseram suas partes "muy" íntimas ultimamente (Britney Spears, Paris Hilton, Juliana Paes, Adriane Galisteu). Naturalmente, nenhuma delas esperava obter publicidade gratuita e apenas tiveram um momento de descuido. Já Freud diria que nada é por acaso.

Agora falando sério: o que que têm essas mulheres? Fogo no rabo? Hiper aquecimento das partes pudendas? Preguiça de vestir? Preguiça de tirar? Bom, só sei que se eu fosse mulher não ia ficar querendo expor certas intimidades anatômicas ao léu. Mas fato é que, independente das motivações, só tenho a apoiar esse movimento e conclamar todas mulheres a aderirem agora mesmo a essa prática tão saudável.

Espalhem esta notícia a todos seus contatos, familiares, amigos e desconhecidos.

Veja o principal trecho da matéria. E de cortesia, segue a foto da Adriane Galsiteu. E não, eu não tenho a imagem sem a tarja. Mas tem um pessoal no Terra que tem. Mais informações favor depositar R$1.000 na minha conta :)

"O ginecologista José Bento afirma que calcinha realmente faz mal à saúde. Segundo o médico, a calcinha, principalmente as de materiais sintéticos e com forros muito grossos, impedem a ventilação do local e aquecem a região, o que acaba promovendo a proliferação de bactérias e fungos no aparelho genital e, consequentemente, o surgimento de infecções e corrimentos. Há ainda mulheres que são alérgicas a determinados tecidos, o que prejudica ainda mais a saúde do aparelho sexual.

Além de doenças sexuais, como a candidíase, o uso de determinados tipos de calcinhas podem provocar o aparecimento de varizes e celulite. Isso é o que afirma o ginecologista José Bento. Mas para que esses efeitos aparecerem, o elástico da região da virilha tem que estar muito apertado."

"A saia não foi criada à toa", diz o dr. José Bento apoiando a atitude das famosas. "As mulheres realmente precisam arejar a região genital". Para ele, um hábito saudável é dormir sem calcinha. "Não há vantagem nenhuma em usar calcinha para dormir. Tudo é uma questão de costume".

segunda-feira, novembro 27, 2006

Religiosos = loucos?

Ultimamente tenho me irritado cada vez mais com as religiões (como o post anterior bem demonstra) e hoje transcrevo uma passagem de um livro que para mim resume muito do que penso, e do que muitas pessoas pensam mas têm vergonha de admitir. Segue abaixo:

"Nós temos nomes para pessoas que têm muitas crenças para as quais não existem justificativas racionais. Quando as crenças delas são extremamente comuns, nós as chamamos de "religiosas"; caso contrário, geralmente as chamamos de "loucas", "psicóticas" ou "delirantes".

Para citar um exemplo: Jesus Cristo - que, como se sabe, nasceu de uma virgem, enganou a morte e subiu fisicamente aos céus - pode agora ser comido na forma de uma bolacha. Com algumas poucas invocações feitas à um cálice cheio de vinho, também é possível beber seu sangue. Há alguma dúvida de que se apenas uma pessoa acreditasse nessas coisas ela seria considerada louca?

Os perigos da fé religiosa é que ela permite a seres humanos normais colherem os frutos da loucura e os considerarem sagrados."


Além de muito engraçado, é real. O autor é Sam Harris, um cientista especializado em neurociências, que escreveu alguns livros contestando crenças religiosas, livros que estão na lista de best-sellers nos Estados Unidos e deveriam ser traduzidos. Outro best-seller do momento é "A Ilusão de Deus" (The God Delusion), de Richard Dawkins, brilhante cientista e advogado de todos ateus do mundo. Para saber mais veja (links em inglês): crítica do livro de Sam Harris e texto de Dawkins no site edge.org

E continuo minha cruzada!!! Ayouuuu Silver!!!!

terça-feira, novembro 21, 2006

Sobre religião e spammers

ATENÇÃO: se você se ofende facilmente com opiniões contrárias às suas e com xingamentos, pare agora!!

Eu avisei hein! Não quero saber de reclamações depois.


Minha visão sobre religião (e spammers)

Embora ninguém tenha pedido, chegou a hora de expor alguns pensamentos meus sobre religião. Na verdade, pouca coisa do que eu vou expor aqui é original, assim como 99% do que eu escrevo e do que qualquer pessoa escreve (veja PS para mais sobre esse tema).

Aliás, a principal motivação para este post ligeiramente mal humorado e irônico são as porras de spam que eu recebo quase todo santo dia falando que Deus me ama, que vai acontecer um milagre às 3:52 horas da manhã se eu encaminhar a mensagem pros meus 17.673 amigos e coisas do gênero.
Como diria um amigo meu (o que geralmente quer dizer que eu disse isso, sabe aquela velha história que "aconteceu com um amigo de um amigo"?): quero que esses cornos de spammers vão todos à PUTA QUE PARIU [pronunciar no estilo Hermes e Renato, abrindo bem a boca e desferindo claramente cada sílaba: COOOOR-NOS, PUUU-TA QUEEE PA-RIUUUU!] . Pronto, desabafei :)

Mas voltanto ao assunto, vamos lá.

Resumindo: todas religiões (sem exceção) são promotoras do ódio, do preconceito e de tudo que de ruim existe nesse mundo. Tá bom, exagerei um pouco, mas é mais ou menos isso (mais pra mais que pra menos). Tenho nojo principalmente das "grandes 3": cristianismo, islamismo e judaísmo.

Ponto 1: cada uma delas e qualquer religião tem convicção de que ela, e só ela, está certa, e as outras estão todas erradas. Como isso é uma impossiblidade lógica, a conclusão natural é que todas estão erradas. Abomino todas elas.

Ponto 2: praticamente todas religiões se baseiam na crença de alguma força superior (geralmente conhecida por Deus) que criou o mundo e vê tudo que acontece e manda um monte de gente pro inferno. Além disso, algumas acham que ele é um cara barbudo. Na verdade muito parecido com o Papai Noel. Na verdade, é apenas uma versão mais rídicula do Papai Noel, já que ninguém com mais de 7 anos acredita no Papai Noel, mas um monte de gente grande acredita em Deus (barbudo, claro). O porquê disso é algo que me foge (tenho algumas teorias mas deixo pra outra hora).

Bom, crianças, cheguem mais perto que vou contar um segredinho: Deus não existe.

Tudo bem, assim como acreditar em Deus é uma questão de fé, não acreditar também é, porque não há como provar cientificamente nenhuma dessas duas posições. Como sou cético,
é preferível ficar com a versão mais simples. Acredito no princípio da Navalha de Occam: se existem duas explicações para um fenômeno, e as duas explicam satisfatoriamente este fenômeno, mas não há como provar qual está certa, é melhor ficarmos com a explicação mais simples, mais elegante, que envolva menos passos duvidosos. E é simplesmente mais fácil e belo explicar o universo sem recorrer a uma explicação teológica. Afinal, o homem criou Deus, e não o contrário.

Por hoje é só pessoal. Outra hora vou explicar melhor porque uma visão do mundo sem Deus ou qualquer coisa do gênero é muito mais bela e fascinante (e correta).

E quem me conhece sabe que sou uma pessoa alegre e de bem com a vida, ao contrário do que possa parecer a alguns pela leitura desse post. Apenas tenho opiniões fortes sobre quase tudo, desde a guerra no Iraque até os implantes de silicone - a saber: sou a favor (dos implantes, claro) mas ainda precisam evoluir pra ficar mais reais. Não, eu nunca encostei num, mas um amigo de um amigo meu já.

E eu avisei hein!!


PS:
Quanto ao fato de eu não ser muito original, bom, pelo menos eu escrevo, ao invés de agir como um spammer zumbi imbecil que encaminha e-mails estúpidos demandando que eu envie para meus 17.673 amigos a mensagem de que Deus me ama. Fora o fato de que ele não existe, se ele existisse aposto que não daria a mínima pra mim ou pra qualquer pessoa, pelo menos não mais do que ele se importaria com uma pedra ou com um gafanhoto, que afinal também "são" criações dele.

segunda-feira, outubro 02, 2006

Selffuckfillingprophecy

A porra da profecia auto-realizável...

A vida tem sentido, não tem? Depende de quem responde. Se você acredita que tem, então tem. Mas objetivamente falando a vida não tem um sentido, e Freud já dizia isso, uma das (poucas) coisas em que ele acertou.

No livro “Cachorros de palha” (Editora Record, R$29,52) o filósofo John Gray nos convence de que nossas vidas não têm sentido. Ou melhor, que não somos nem menos nem mais do que qualquer animal. Nos consideramos tão especiais, somos os únicos a ter isso, os únicos a fazer aquilo, os senhores da Terra e do Universo. Deus foi feito à nossa semelhança. Então somos especiais.

Mas no fundo vivemos numa ilusão. É ruim? Na maior parte das vezes não. O auto-engano é a mais sofisticada de nossas invenções, principalmente porque não nos damos conta dela. E ele também acerta quando diz que não buscamos a verdade, só sofredores querem a verdade.

Nós queremos sexo, comida e dinheiro.

O sexo como motivação última e muitas vezes inconsciente de nosso comportamento, como frisava Schopenhauer. Aliás, a maior parte de nossa vida é inconsciente, muito mais do que nos damos conta ou do que gostaríamos. Nos imaginamos senhores da Terra, mas não somos nem mesmo senhores de nós mesmos. O livre-arbítrio, a capacidade de escolha são as maiores ilusões criadas pelo nosso cérebro. Não há self, não há homúnculo, a maior parte de nossas decisões são tomadas sem sabermos porque, sem que tenhamos tido uma influência consciente. O acaso faz maior parte de nossa vida do que gostaríamos, as maiores decisões a nosso respeito foram tomadas por nós sem nenhuma possibilidade de nossa influência (onde nascemos, quem são nossos pais, nossos genes).

E no fundo somos muito parecidos uns aos outros, muito mais parecidos do que diferentes, por qualquer medida que se queira usar. Nós, como espécie, somos incrivelmente parecidos entre si. No entanto, esquecemos disso e acabamos nos concentrando nas diferenças, que naturalmente são o que se destaca. Mas assim, como todos os leões de todos documentários parecem ser exatamente o mesmo leão, aos olhos de um leão qualquer homo sapiens seria indistinguível dos outros.

Apesar de tudo, nos achamos especiais, e isto não deve surpreender, pois faz parte de nosso maquinário evolutivo, mas é certamente é algo muito exagerado. Cada animal tem uma especialidade, tem aspectos únicos: golfinhos se comunicam por infra-som, caçam presas com sonar, tubarões percebem mudanças no campo elétrico, pombos se localizam através de um sistema de orientação em seu bico, num processo que só agora começa a ser entendido. E os exemplos são infinitos.

Sim, podemos ser o único animal que ri, que pensa no futuro. Mas por outro lado nosso olfato é horrível, nossos bebês são os mais frágeis, nossa visão noturna é a de um cego em comparação à visão dos felinos, nossa audição é a de um surdo comparada entre muitas deficiências. Cada animal desenvolve capacidades únicas que os permitem se adaptar a seu meio e sobreviver. Nada de espantoso nisso. Quer dizer, a vida é espantosa, mas o processo é rigorosamente o mesmo para todos seres vivos.

E a morte nos confronta com o que não queremos confrontar: a preciosidade da vida, este breve instante que temos e que é o único que teremos para fazer algo. Não vale convocar a vida eterna. Temos horror ao fim. Não nos percebemos como parte de algo maior. E esse algo maior não está se lixando para ninguém, não há salvação pois não há do que se salvar.

E agora meu vô não está mais aqui em casa. Ervino Aloysio Flach. Foi enterrado hoje pela manhã, em Alto Feliz, ao lado de minha vó que não conheci. E agora meu primo Gustavo está sentado na cadeira que meu vô usava todo o dia, em nossa casa, em Nova Milano, onde ele conviveu conosco nos últimos 20 anos.

A chuva é constante, a cerração é a usual, o clima é de um dia de inverno como tantos outros. Mas agora há um vazio a mais. Uma cadeira sem dono. Um quarto sem ocupante. Um livro sem leitor. A poltrona, fica ao lado de uma janela de onde se pode ver o jardim, com as flores que ele tanto gostava e cuidava, além de algumas araucárias e casas ao longe. Não é uma vista espetacular, mas é bonita. O calendário na parede marca o dia em que ele saiu para o hospital, 7 de agosto. Um calendário que ele sempre virava a página, sempre com uma foto de um animal e um dizer supostamente sábio.

E agora não há mais como saber se ele gostava do calendário, se ele gostava dos bichos, dos dizeres, dos dois ou de nenhum. Há mais um monte de coisa que nunca mais saberemos. Sempre parecia que haveria tempo para contar mais histórias. Tempo para sentar e fazer entrevistas, desvendar o passado de todos antepassados, desvendar as vidas e as histórias. Eu me culpo por isso, me culpo por ter ouvido pouco as histórias de meu vô, de ter lhe contado tão pouco da minha vida. Mas nem para meus pais eu conto muito. E o vô gostava de falar, falava de muitas coisas, de amigos, desafetos, visitas, parentes. Falava de e falava com. E às vezes não deixava ninguém falar :)

Mas agora todo mundo pode falar, eu posso falar horas com ele e não vai haver resposta. Tenho que me consolar com as respostas que tive, com os exemplos que ele me deu. No geral, teve uma vida aparentemente resignada, mas é aparente pois no fundo ele tinha suas motivações e fez suas escolhas. Teve sofrimentos e alegrias, como qualquer um. Amava sua família. Amava sua terra. Amava a música. Amava as flores. Amava a leitura. Amava ensinar. Amava falar. Amava contar suas histórias. Amava viver. Amava distribuir, não queria guardar para si, não tinha praticamente nada mas tinha o que o fazia feliz. Estava com amigos, estava com sua família e isso bastava.

Adeus, meu vô.


H. Schneider
14 de agosto de 2006


Para saber mais sobre o excelente livro "Cachorros de Palha", leia a entrevista com o autor John Gray aqui